domingo, 24 de maio de 2020

Varinas - Um Símbolo de Lisboa


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O Cinema São Jorge recebeu no passado dia 21 de Maio de 2015 (fez 5 anos), pelas 21h30, o documentário Varinas – Um símbolo de Lisboa. Lá assisti com muito agrado. Como é que uma ílhava não iria assistir?Tive de lá estar. Há espectáculos que não se podem perder. Ainda para mais com depoentes, com quem convivo dia a dia – Márcia Carvalho do Museu Marítimo de Ílhavo (MMI), Luís Martins da Universidade Nova e Senos da Fonseca, entre outros conhecidos.

Como foi possível que a vendedeira de peixe da Beira Litoral, chegada a Lisboa no século XIX, se transformasse num símbolo da capital? O documentário Varinas – Um Símbolo de Lisboa narra a história da presença da comunidade (o)varina na cidade, leva-nos ao encontro das últimas varinas de Lisboa e mostra-nos o fascínio que esta mulher arrojada e desinibida, deixou no imaginário alfacinha.
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Ílhavas.Vendedeira de Sardinha.
Gravura de Joubert
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A estrutura do documentário insere-se no levantamento de Memórias da cidade de Lisboa, assente no projecto de investigação sobre as Varinas realizado pelo Departamento de Património Cultural da Câmara Municipal de Lisboa. Iniciado em 2013 com o registo de testemunhos orais das últimas varinas de Lisboa, considerando a sua urgência e pertinência para memória futura, seguiu-se uma ampla investigação interdisciplinar. Esta assentou em fontes documentais, gráficas e audiovisuais que permitiu conhecer esta comunidade, as relações entre si, os seus quotidianos, bem como a varina enquanto figura popular, mulher trabalhadora e mãe, cuja liberdade na linguagem, costumes e atitudes na rua cedo captaram variadas atenções, convertendo-se, por mérito próprio, em símbolo da cidade de Lisboa.

A sua postura afirmativa e despida de preconceitos, espartilhos ou convenções, o seu carácter desinibido e irreverente, visível no espaço público, surge num contexto onde este era ainda de domínio masculino. A dimensão e atitude desta comunidade (o)varina marcaram de forma indelével a cidade, atribuindo-lhe um novo fácies, onde os seus costumes e tradições foram a marca de uma identidade que atravessou a centúria de oitocentos e veio a dissipar-se ao longo da segunda metade do século XX, envolta numa melancólica saudade da figura que animava e perturbava a pacatez da Lisboa ainda rural.

O documentário contou com a participação de Senos da Fonseca e Márcia Carvalho do Museu de Ílhavo, José Garcia e Delminda Rijo do Gabinete de Estudos Olisiponenses, António Miranda do Museu de Lisboa, Maria de Aires Silveira do Museu de Arte Contemporânea do Chiado, Gonçalo Gonçalves e Pedro Prista do ISCTE – IUL, André Fernandes e Luís Martins da Universidade Nova e Sofia Tempero do Departamento de Património Cultural da Câmara Municipal de Lisboa. Através do corpo de depoimentos destes convidados, o filme aborda as vivências desta comunidade, desde o seu «berço» na laguna de Aveiro até ao momento do desaparecimento do mercado da ribeira em Lisboa.
Adorei assistir, considerei o documentário muito bem conseguido, sobretudo no que diz respeito àquele movimento aguerrido e inquieto das varinas da capital, ao longo dos tempos.
Relativamente à participação ílhava, é claro que nos deixa sempre uma pontinha de vaidade, ao vermos e ouvirmos «artistas» da nossa terra a actuarem em cenários que nos são tão familiares – Senos da Fonseca, em passeio lagunar, num belo dia de sol, a bordo do moliceiro "Pardilhoense", timonado pelo seu arrais e amigo Miguel Matias e Márcia Carvalho, do MMI., tendo como pano de fundo a "nossa bateira ílhava".
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A bordo do moliceiro "Pardilhoense"

Sinceramente, gostei. É um pouco da ria de Aveiro (de Ovar, da Murtosa, de Estarreja, de Ílhavo) que as varinas de Lisboa foram mantendo na sua "guelra" e na sua presença, através de gerações.
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Tive a informação de que o documentário deveria vir a passar, pelo menos, em Ílhavo e em Ovar. Vamos a isso! Para revermos  e para que     seja mais   acessível aos " ílhavos locais". Agora, à distância de 5 anos, assim ocorreu - no 78º aniversário do MMI.,  por volta de 8 de Agosto de 2015.
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Ílhavo, 24 de Maio de 2020
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Ana Maria Lopes-

sexta-feira, 1 de maio de 2020

A explosão no arrastão Vasco d'Orey



O “Vasco d’Orey”, arrastão clássico, assim como o seu gémeo “Santa Maria Madalena” foram construídos para a Empresa de Pesca de Viana, pelos Estaleiros Navais da mesma cidade. A 1 de Maio de 1961, ocorreu a cerimónia da flutuação do primeiro, muito concorrida e animada. Fazem, hoje, 59 anos.

Foi seu primeiro comandante o ilhavense Capitão Manuel Machado dos Santos (Praia).
Deram um grande apoio, quer navio, capitão e tripulação, em 23 de Abril de 1971, ao naufrágio do arrastão de popa “Santa Isabel” propriedade da EPA, em situação trágica e prestes a voltar para Portugal.
A 10 de Abril de 1963, um grave acidente na casa dos caldeiros, quando os pescadores estavam a vestir as pesadas roupas para a manobra, – um dos caldeiros explodiu, deixando o compartimento com um ambiente demoníaco. Com queimaduras de vários graus, ficaram 10 tripulantes, que foram levados com eficácia para um hospital de St. John’s, apesar de se encontrarem a 30 horas de navegação.
Este episódio, já de si, grave, teria sido premonitório de um outro, neste caso, fatal – pensámos.
Comandado por António Fernando Paroleiro dos Santos, quando se encontrava atracado no porto de St. John’s a abastecer de combustível, em 29 de Setembro de 1977, aconteceu uma enorme explosão, seguida de violento incêndio.
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Atracado ao cais, ocorreu forte explosão…
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Infelizmente, nesta tragédia, perderam a vida cinco tripulantes: dois de Vila Praia de Âncora, um de Mira, um de Vagos e José Melo Vaz, de Ílhavo.
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Na referida situação…
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Embora tivesse sabido, só há pouco tempo tomei verdadeira consciência de tal desgraça, até porque também fora um período muito difícil da minha vida.
Interroguei-me. O Jornal da terra, como sempre, há-de ter noticiado tão terrível tragédia. Busquei o ano de 77, folheei e no de primeiro de Outubro deparei com esta notícia:
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Ilhavense morre na explosão de um navio bacalhoeiro
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À hora a que o nosso jornal entrava na máquina, soubemos que grave acidente com explosão seguida de incêndio ocorreu no arrastão “Vasco d’ Orey”, que, em St. John’s de abastecia de combustível.
(…). Do acidente resultou a morte de cinco tripulantes. Um dos que veio a sucumbir aos ferimentos, foi António José Melo Vaz, de 27 anos, casado, natural de Ílhavo e residente na rua Dr. Samuel Maia.
Deixou 4 filhos menores.
Mais um verso para Ílhavo heróico poema escrito com sangue no mar…
Quanto ao navio, ainda em chamas, foi rebocado para fora do porto, pelo “Rio Lima”, da mesma empresa, tendo sido encalhado em Spring Point à saída da barra de St. John’s, onde a força do mar o acabou por desmantelar.
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 Em Spring Point, ao sabor do mar…
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Ílhavo, 1º de Maio de 2020
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Fontes: A Pesca do Bacalhau, Tomo IV, “Arrastões” de J. D. Marques
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Ana Maria Lopes-