Em casa de Zé da Pardala. 1993
E cá vem, hoje, a lume Francisco Ramos (Balau). Bom homem, atencioso,
educado, sabedor e prestável. Dele fiquei com gratas recordações.
Nascido em Ílhavo (1915-2002), Chico Ramos, como era conhecido, foi grande
marinheiro.
Conhecida da família, já que a minha mãe era madrinha da sua filha, Maria
Rosalina, eu frequentava a casa, ali num beco próximo, em Espinheiro, com
assiduidade.
Imagino que tenha ido cedo para o mar como acontecia com todos, à época. A
partir dos registos, foi ajudante de motorista de 1936 a 1939 no lugre Navegador, construído em Fão, por José
Linhares, em 1924, com o nome de Esperança.
Na campanha de 1929 passou a propriedade da firma Parceria Marítima Douro que o
rebaptizara de Navegador.
Em 1940, foi pescador maduro/especial
no Santa Quitéria, tendo naufragado
em 1941, com água aberta, nos
grandes bancos da Terra Nova.
O Santa
Quitéria, em naufrágio, em 1941
Sabendo que Francisco
Ramos tinha feito oito viagens no Milena
entre 1942 e 1950, como contramestre, lembrei-me de folhear o magnífico livro
que é Milena - 1948 | Memórias de uma campanha da autoria de Armindo
da Silva Bagão, de onde rebusquei alguns diálogos/descrições em que Francisco
Ramos era protagonista. A saber…
-
Aliás todo o trabalho
de marinharia tinha de ser feito com toda a perfeição, até porque o
contramestre, o ilhavense Sr. Francisco Ramos, era muito competente em
marinharia e exigia perfeição ao pessoal com ele trabalhava. Ílhavo foi um
alfobre de grandes contramestres e marinheiros, apreciados até mesmo em navios
estrangeiros, p.15. (…)
Em
virtude de o piloto nunca ter embarcado e não ter o curso de pilotagem o
capitão Tude chama o contramestre, o Francisco Ramos (Balau), homem com grande experiência
nos assuntos de mar e diz-lhe:
- «Ó
Francisco, até chegarmos aos bancos da Terra Nova, tu é que vais tomar conta do
quarto do piloto e vais-lhe ensinando o que deve fazer e os cuidados que se
devem ter com os panos todos em cima e quando se devem mandar arriar as estênsulas
(…) respondendo-lhe o contramestre:
- Fique descansado, Sr.
Capitão, que tudo vai correr bem», p. 31. (…)
Com
o Milena entre vagas alterosas, o capitão volta-se, agora, para o contramestre
e pergunta-lhe:
-
«E tu, Francisco, qual é a tua opinião,
neste momento?».
Responde-lhe
o contramestre:
-
«Ó Sr. Capitão. A minha opinião é a mesma
do Sr. Imediato. Da maneira como está o mar, o Milena não se vai escorar por
muito mais tempo de capa ao temporal que está aí».
-
«Pronto», diz o Capitão, «Francisco, vais aos ranchos chamar a
companha toda para cima, prontos para o pior, porque vamos desfazer a capa», p.
53. (…)
«As
vergas depois de bem travadas do balanço foram arriadas pelo pessoal que estava
no convés, sem perigo. Foram estes grandes marinheiros Francisco Ramos, Carlos
Agualuza e Luís Caramonete», p. 55.
-
A bordo do Milena,
entre 1946 e 47
Entre
1951 e 1955 (inclusive), Chico Ramos foi pescador especial no lugre-motor
Brites, tendo terminado a sua
carreira de mar, como contramestre e pescador especial, no navio-motor Celeste Maria, entre 1956 e 1960,
construído em 1954, no estaleiro de Manuel Maria Bolais Mónica para a Parceria
Marítima Esperança, Lda.
Dóris
do Brites
Em
mais do que merecida estadia em terra, após a vida de mar, foi de grande
simpatia e utilidade para o «nosso Museu», a partir dos anos 90.
Prestou
informações preciosas para a execução das folhas de sala da exposição Faina Maior
e, sempre que chamado, vinha acudir, a trabalhos específicos de marinharia, na
montagem da grande exposição (Novembro
de 1992).
A
vista, entretanto, começou a atraiçoá-lo, mas nunca deixou de colaborar com
maior ou menor dificuldade.
Mesmo
no NTM Creoula, quando havia
serviços de intercâmbio cultural entre o navio e o Museu, ele, se era
solicitado, respondia logo à chamada.
No Creoula,
em 1993
No
majestoso Creoula, a 19 de Setembro
de 1993, ao aparelhar um bote, aplicava o quete da ré, entre outra palamenta.
A
minha gratidão e reconhecimento ao Amigo Chico Ramos, grande homem do mar.
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Fotografias
– Arquivo pessoal e gentil cedência da Família de Francisco Ramos
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Ílhavo, 21
de Abril de 2016
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Ana Maria Lopes
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