sábado, 20 de setembro de 2014

A presença dos «ílhavos» no Cais da Ribeira

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Pessoa amiga, conhecendo os meus gostos, teve a amabilidade de me oferecer uma fotografia em suporte de papel, cerca de 15 por 20 cm, conseguida na livraria Galileu de Cascais. Fiquei encantada. Para mim, um registo único.
Todas as imagens que até agora conheço de bateiras ílhavas são registos isolados, em princípio. Esta, pelo contrário é um registo integrado.
 
É um tal entrelaçado de pessoas e barcos que ofusca e seduz. Imaginamos, pois, que se trata de uma cena cujo palco é o Cais da Ribeira, que engloba classes de vários estratos sociais – pelo aspecto e, sobretudo, pelo diferente trajar.
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Rapazotes, de boina ou boné, sentados no cais, descalços… Raparigas, de saia comprida, coberta por avental, encilhados por faixa escura, e blusa de manga comprida, lisa ou axadrezada. A cabeça protegida por lenço atado sob o queixo, ou caído de pontas soltas, coberto por chapéu redondo, em formato de queijo, tipo miroa ou de aba pouco larga…Alguns senhores de fato escuro e chapéu de feltro de aba
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Encalhadas na areia, proas e popas emaranhadas, com vergas e mastros cruzados, de embarcações distintas – traineira de Peniche, caíque do Algarve, canoas de Cascais…
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Ao largo, ancoradas, pesadas fragatas, no seu negro característico, com roda de proa direita, bem distinta da do varino, com a água a tocar os bordos, tal era a sua carga. Aqui e acolá, ao longe, «pintado» um ou outro navio…
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É este o quadro que me encanta e seduz… Mas o que é que mais me fascina e atrai?

 
Entre este emaranhado complexo, é a presença de duas bateiras ílhavas, nas suas proas bem abicadas, negras, donairosas, altivas e elegantes.
 
É a presença dos ílhavos, no seu barrete negro de borla, aqui e acolá, de gabão escuro, sobre manaias e camisa claras.
 
Seguindo com paciência as linhas das bateiras, entre pessoal apinhado na praia, somos conduzidos às suas rés, varadas na areia.

Um quadro raro, fotografado, da nossa expansão, litoral abaixo. Na ausência de data, pelo que venho observando, arrisco-lhe uma datação – ali pelo último decénio do século XIX.
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Apreciem…que vale a pena.
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Ílhavo, 15 de Agosto de 2014
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Ana Maria Lopes
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domingo, 14 de setembro de 2014

Ida à Nossa Senhora da Maluca. 2014

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Costuma ter sempre lugar no 2º domingo de cada mês de Setembro, a romaria da Senhora da Encarnação, também conhecida por Senhora da Maluca. Quase sempre a passei aqui pela Costa Nova, apreciando o possível, desta margem. Em dia antecedente, quando havia barca da passage, uma banda de música atravessava a ria, vinha cá dar um ar da sua graça e atirar uns foguetes. O fogo-de-artifício de domingo à noite, também o apreciava cá de casa, quase mesmo que não quisesse.
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Barca com a música a bordo. Anos 80

Hoje, pelas 9 h, uma arruada cujos músicos se identificavam por tee-shirts verdes, também nos visitou, em peditório e foguetório, como que numa chamada de atenção, para a festa, na outra margem.
Na rota das romarias setembrinas, partimos no moliceiro Pardilhoense do Jardim Oudinot, em direcção à Gafanha da outra banda, a que faz uma falta inconcebível o seu cais de atracação que sempre conheci e que fazia parte integrante da paisagem.

Antigo Cais da Bruxa. 2011

O tempo incerto deste Verão mais uma vez nos fez antecipar a ida de domingo para sábado e, assim, não presenciámos a procissão, nos seus pormenores característicos – irmandades, andores prodigamente floridos, ingénuos anjinhos de asas leves e brancas e bandas de música – que é domingueira.
Depois de uma aproagem do barco, a sul da ria, para os mais corajosos tomarem um banho ou molharem os pés, numa água morna e cativante, rumámos, com vento favorável, à outra banda.

A segurar o moliceiro

Com um dia extremamente quente e abafado, por entre atalhos sufocantes, chegámos aos arredores da capela, recebidos por foguetório entre milheirais. Os mais acalorados assaltaram as tasquinhas de cerveja e água fresquinha, enquanto as tendas de gelados, bolos festivos, e algodão doce faziam nascer água na boca aos mais lambareiros.
 
Resolvi entrar na capela, que tem a curiosidade de ter sido construída, lá pelo século XIX, em terrenos da sua quinta oferecidos pela benfeitora Joana Rosa de Jesus, de alcunha, Maluca. Daí o nome por que é conhecida a Gafanha e a sua padroeira – Nossa Senhora da Encarnação (Maluca).
Apesar de ser uma capela reconstruída várias vezes e modernizada, tem um ambiente singelo e acolhedor, em que os forasteiros se sentem bem. Alguns devotos enfeitavam os seis andores, com flores coloridas e diversificadas, artisticamente colocadas, que ultimavam para a procissão do dia seguinte – a Santa Padroeira, o S. José, a Senhora de Fátima, a Senhora de Lourdes, o Santo António e o Sagrado Coração de Maria – informaram-me.
De volta à ria, os mais galhofeiros iam brincando e bailando, completamente suados, enquanto outros apreciavam os montes de junco, de onde a onde distribuídos, para juncar a estrada no percurso da procissão, em sinal tradicional de fé e respeito. Ainda se viviam muito os preparativos.

Nossa Senhora da Encarnação

Sequiosos e exuberantes, fizemos um ataque ao ANGE, para saborear alguns petiscos, a «empalhada» e o «cervejão». Ninguém parecia ter pressa em regressar, mas as nuvens já iam toldando o céu e encobrindo o sol que começava a aproximar-se da linha do horizonte.

De chegada ao Oudinot, despedimo-nos até uma próxima romaria, se o tempo consentir.

Eu, aqui do meu poiso – a minha janela, na Costa Nova, virada para a ria –, quer o tempo consinta quer não, apreciarei logo à noite, o espectáculo pirotécnico da Senhora da Maluca, lá do outro lado da ria, como é hábito, todos os anos.
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Fotos cedidas gentilmente pela Etelvina Almeida.
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Costa, Nova, 14 de Setembro de 2014
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Ana Maria Lopes
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sexta-feira, 5 de setembro de 2014

O Senhor Jesus dos Navegantes, em Ílhavo - 2014

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Realiza-se anualmente a festa do Sr. Jesus dos Navegantes, no primeiro domingo de Setembro. Esta é, talvez a de maior tradição, e a que se mantém mais viva de entre as festas de Ílhavo.
A imagem do Senhor Jesus, um Cristo crucificado (…) desce do altar (na sexta-feira anterior) para incorporar o andor, com a miniatura do lugre bacalhoeiro “Navegante” do seu lado direito, num mar de lona pintada, dando mote ao que é a sua denominação popular: Senhor Jesus dos Navegantes.
Ílhavo, terra de porto de mar, onde existem registos de pesca longínqua desde finais do séc. XVI, reza em devoção, lembrando seus marinheiros e embarcações naufragadas, vidas de esforço feitas de água salgada e peixe.

Andor, com o Altar como fundo, antes da Procissão

Cumprindo uma tradição centenária, é exactamente, neste fim-de-semana, de 5 a 8 de Setembro que se realiza a festa, o que nem sempre aconteceu, tendo-se já efectuado, em anos transactos, em Novembro (1941, 54 e 55) e até em Dezembro, em 1956, com a frota bacalhoeira já no ancoradouro.
 

Procissão numa das ruas de Ílhavo – Anos 60

O modelo do lugre “Navegante”, com três mastros e velas latinas, foi construído pelo marinheiro ilhavense José Domingues Pena, nascido em 1902.

Lugre Navegante, em pormenor

Ao começar a sua miniatura, o autor teria 17 anos, levando peças para bordo para ir trabalhando em dias de temporal, como, aliás eram hábito dos marítimos habilidosos. Quando naufragou na pesca do bacalhau, prometeu ao Senhor Jesus dos Navegantes que, se a acabasse, lha ofereceria e assim o fez, em 1919. A miniatura esteve na Igreja Matriz algum tempo, passou a ficar guardada na casa de uma irmã de José Pena, ficando mais tarde definitivamente na Igreja. Tem sempre figurado na procissão, no andor do Senhor Jesus, tendo sofrido alguns restauros conservativos, que eu saiba, em 1992 pelas hábeis mãos de José Alberto Malaquias e, outro, em 2007, pelo Capitão Francisco Paião, dada a sua fragilidade, os efeitos do tempo e a saída agitada no andor, difícil de transportar pelo peso excessivo e demasiada altura.

Do programa religioso são de destacar a Sagrada Eucaristia, na Igreja Matriz, pelas 11 horas de domingo, bem como a saída da Procissão em honra do Santo Padroeiro, pelas 17 horas, tendo lugar, no cais da Malhada a bênção das actividades marítimas, com a presença da Banda dos Bombeiros Voluntários de Ílhavo, Banda Filarmónica Gafanhense e Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Vila Nova de Famalicão.

Na segunda-feira, dia 8, último dia das festividades, pelas 19 h, terá lugar na nossa Igreja uma Missa de sufrágio pelos marinheiros falecidos e são muitos! Segue-se a entrega dos ramos da mordomia.

Quem não rema, já remou!” – diz a tradição e a Igreja costuma ficar repleta, pois a maioria das pessoas tem raízes ligadas ao mar.

Outros e variados eventos de carácter profano completam a Romaria, no Jardim Henriqueta Maia.

A escultura do “nosso” Senhor Jesus e a miniatura do “Navegante” foram integrados com todo o aparato na Bênção dos Lugres Bacalhoeiros, em Belém, no dia 12 de Abril de 1953, há 61 anos.


Bênção dos Lugres Bacalhoeiros, em Belém

Não foi a única saída que teve, a miniatura. Depois da festa de 1992, até finais de 1993, a miniatura teve uma guarida diferente. Foi albergada e acolhida afectuosamente numa vitrina do MMI, integrada na exposição Faina Maior, Pesca do bacalhau à Linha, no painel Ex-Votos. Curioso que no ano de 1993, o modelo foi transferido do museu para os festejos religiosos e ao museu voltou, visto que a exposição, em princípio, temporária, ainda não tinha alcançado o seu término.
FontesSenhor Jesus dos Navegantes – Mar e Devoção de Hugo Cálão e Isabel Cachim Madaíl. Agosto de 2007.
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Folha de Sala Ex-Votos, de Ana Maria Lopes. Novembro de 1992.
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Imagens – Arquivo pessoal da autora
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Ílhavo, 5 de Setembro de 2014
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Ana Maria Lopes
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