Relembrando…
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Último ensaio, em 15 de Novembro de 2013
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Ílhavo
e a sua região de que tanto se fala como centro difusor de cultura marítima
terão deixado, por via directa ou indirecta marcas na cultura marítima do nosso litoral.
Habituámo-nos
desde cedo, quando visitámos zonas marítimas, para pesquisa etno-linguística,
desde estudante universitária, a ouvir tecer algumas considerações relativas a
Ílhavo e aos habitantes locais, mal se apercebiam que era oriunda da citada
região.
E
começámo-nos a capacitar-nos de que onde
existia uma bateira existiu um ílhavo ou há vestígios, pelo menos, da passagem de um ílhavo.
Cremos
mesmo que por Ílhavo tem havido um interesse crescente pela grande faina dos ílhavos no litoral, não tendo tido a
exposição temporária, «A Diáspora dos ílhavos», no MMI, de 8 de Agosto a 31 de
Outubro de 2007 a aceitação desejada pela maioria dos interessados nesta grande
questão da identidade local.
Virando
costas à Laguna, por inóspita que estava, os ílhavos, com suas artes ainda algo rudimentares, fixaram-se junto
ao mar. Aberta definitivamente a barra em 1808, vieram instalar-se no areal a
que chamaram Costa Nova (arrais Luís Barreto, igualmente conhecido por Luís da
Bernarda) com as companhas da xávega. Tão
exímios se tornaram no manejo destas artes estes emigrantes da borda do mar,
refere Senos da Fonseca, que o desejo de
partir em busca de locais onde o peixe fosse mais abundante se tornou evidente (Senos
da Fonseca, Ílhavo – Ensaio Monográfico –
Séc. X ao Séc. XX, 2007, Papiro Editora. Porto, 2007, pp. 174 a 181).
A
fundação da Cova e Gala por ílhavos
tem-se apresentado um caso mais polémico, porque se tem baseado, de livro em livro,
em afirmações não confirmadas por registos paroquiais estudados ultimamente pelo
pesquisador Hermínio de Freitas Nunes.
A
presença ou a passagem de ílhavos por Palheiros de Mira, também Raquel Soeiro
de Brito a comprovou (Palheiros de Mira –
Formação e declínio de um aglomerado de pescadores. Edição Fac-similada,
Cemar. Praia de Mira, 2009, pp. 21 e 36), ao consultar Registos Paroquiais,
concluindo que entre 1835 e 1870 as populações
originárias de Ílhavo foram as que mais contribuíram para a formação do
povoado.
Mas
a sua característica de nómadas da
beira-mar fez com que não parassem. Pela Nazaré também andaram, tendo
contribuído para a sua formação. Na pequena monografia Nazaré e o seu concelho, Raúl de
Carvalho, (Lisboa, 1966, p. 21), depois de algumas alusões aos pescadores de
Ílhavo, referencia que estes, após terem
abandonado as suas terras, em busca de melhor vida e mais fartura de peixe,
constituíram os primitivos povoadores da Nazaré.
E
Raúl Brandão, no capítulo dedicado à Nazaré de Os Pescadores (Edições Estúdios Cor, Lda. Lisboa, s.d., p. 160),
afirma pela boca de Joaquim Lobo, que aquela gente viera de Ílhavo e recorda ainda que foram os cagaréus que povoaram
os melhores e mais piscosos pontos da costa, vindo pelo litoral abaixo, aos
dois e três barquinhos juntos, até ao Algarve.
Também
tivemos conhecimento da influência que os referidos povos exerceram na
Ericeira, visto que Joana Lopes Alves, ao ocupar-se da rede do linguado ou tresmalho, assegura ter sido trazida para a Ericeira pelos pescadores da Murtosa, que a
usavam na sua terra (A linguagem dos pescadores da Ericeira. Junta
Distrital de Lisboa. Lisboa, 1965, p.
57).
Mas
não ficaram por aí. Também na Costa da Caparica, associando as pescas estivais
de mar a fainas invernosas em rios e estuários, os ílhavos aí se instalam por volta de 1770, sendo referido por Helena
e Paulo Nuno Lopes (A Safra. Livros
Horizonte, Lda. 1995, p. 57), que no
final do séc. XIX, trabalharam na Caparica, na pesca, mais de setecentas
pessoas.
Igualmente
Maria Alfreda Cruz ao ocupar-se do tresmalho,
certifica que é conhecido, em Sesimbra,
por «redes de ílhavos» designação que denuncia a sua proveniência (Pesca e
Pescadores em Sesimbra. Centro de estudos Geográficos. Lisboa, 1966, p.
54).
Também
por finais do século XIX, continuam a referir Helena e Paulo Nuno Lopes (ob.
cit., p. 57) que os pescadores de Ílhavo
chegam à costa alentejana, para aí trazendo as suas famílias, tendo vivido aí,
em inícios do século XX, quarenta famílias.
Todos os anos chegam ao Tejo umas
dezenas de barcos varinos – é o nome que dão a estas embarcações pequenas e
rasteiras, com um mastro e proa levantada (…). Quando se levanta borrasca encalham
o barco nas margens do rio e abrigam-se à proa, debaixo de um oleado encerado (não haverá aqui hábitos idênticos?), onde dormem, cozinham e consertam as redes.
Também emigram para o Tejo barcos
«ílhavos», que são maiores e andam à pesca da sardinha entre o cabo da Roca e o
Cabo Espichel. E há muitos pescadores da Vieira que vão para os campos de Vila
Franca e Santarém pescar o sável. Os da Borda-d’água chamam-lhes «avieiros» –
ascendentes que ficariam a viver nos seus barcos até ao último quartel do
século XX.
Francisco
Oneto Nunes (Vieira de Leiria – A
História, o Trabalho, a Cultura. Edição da Junta de Freguesia de Vieira de
Leiria, 1993, p.174), baseando-se na informação recolhida nos registos
paroquiais da freguesia de Vieira de Leiria refere que desde 1911 até 1933, os livros de registos de óbitos indicam o
falecimento de 19 indivíduos já de idade avançada, cujos pais eram naturais de
Ílhavo, Mira, Tocha, Quiaios, Figueira da Foz e Lavos. Oneto Nunes sublinha a existência, em 1790, de dois barcos de
pesca, que habitualmente costumavam pescar nas costas de S. Jacinto, de fins de
Junho até Fevereiro, e que seguiam depois para o Tejo.
Parece
que a ida, se bem que temporária de "ílhavos" para o Tejo, começa a ser incontestável, porque registada por alguns
documentos e estudiosos.
Também
fomos recolhendo alguns testemunhos orais. Ao entrevistarmos, nos anos 80 do
século passado, na Murtosa, Joaquim Maria Henriques (Raimundo), construtor
famoso de embarcações lagunares, aí nascido em 1909, testemunhou-nos que «algumas
vezes se deslocara com o pai a Peniche, Setúbal, Alcácer do Sal, Vila Franca de
Xira, Carregado e Salvaterra de Magos para a construção de bateiras que os murtoseiros utilizavam, quando para esses locais
iam fazer a safra do sável».
Também
A. A. Baldaque da Silva, a quem é atribuída uma pesquisa extremamente
criteriosa em 1886 (Estado Actual das Pescas em Portugal – A Pesca Marítima,
Fluvial e Lacustre em Todo o Continente do Reino, referido ao ano de 1886.
Lisboa, Imprensa Nacional, 1891, pp. 197, 240, 241, 287 e 403), faz inúmeras
referências ao carácter emigrante dos povos da região da Murtosa, Ílhavo e
Aveiro. Ao ocupar-se da rede sardinheira,
afirma que os pescadores ílhavos que
emigraram para Setúbal, lá usaram uma sardinheira (rede de emalhar sardinha),
de menores dimensões. Averiguou também em inquérito directo a que procedeu que trinta barcos ílhavos, tripulados por
450 homens, depois da pesca costeira à tarrafa, iam pelo rio acima para a pesca
do sável. Eram também os pescadores ílhavos que emigravam para a enseada entre
os cabos da Roca e Espichel e aí usavam, nuns barcos com o seu próprio nome, a
rede de cerco volante, designada por tarrafa.
Sobre
este barco ílhavo (também conhecido
por bateira ílhava), refere-nos que era um barco de fundo chato, construído nas
margens da ria de Aveiro, com um compartimento fechado à proa, para abrigo de
parte da tripulação, com mastro a meio, aparelhando vela latina de pendão,
navegando mais vulgarmente a remos, movidos por três a quatro homens. Empregam-se muito na pesca da sardinha, na
enseada de Entre cabos da Roca e de Espichel, durante o inverno, usando a tal
rede denominada tarrafa.
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Aprestos, por quem sabe…
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É,
no entanto, o tresmalho (rede de emalhar formada por três redes
sobrepostas) a rede mais difundida pelos ílhavos, que em grande número
emigraram durante a época do sável para o Douro, Tejo e Sado, continua
Baldaque da Silva.
Todas
estas citações elencadas não pretendem ser mais do que um ponto de reflexão.
Ainda
há bem pouco tempo, ao abordarmos o livro "Canoas
do Tejo" de Luís Sande e Pedro Yglesias de Oliveira (Edição da Câmara
Municipal de Cascais, 2009, p. 92), achámos curioso o parágrafo que passamos a
transcrever – As bateiras são embarcações
pequenas, com cerca de cinco a seis metros, com uma construção muito simples,
que foram introduzidas no Tejo pelos avieiros, ou cagaréus como eram
conhecidos, que eram comunidades que vieram da zona de Aveiro e se instalaram
nas margens do Tejo. Viviam em pequenas casas palafíticas, construídas em cima
de estacas e nas próprias bateiras. Ainda hoje existem avieiros a viverem
nestas condições e a pescar em embarcações que não têm sequer motor auxiliar.
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E
assim se foram expandindo os ílhavos…os
ditos colonizadores da areia…– tínhamos por cá estas notas…outros terão
outras… e documentos, para enriquecer o caudal da diáspora dos ílhavos.
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A. Esteves e Marco Silva içam a vela…
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Ílhavo,
04 de Dezembro de 2022
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Ana Maria Lopes
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