domingo, 19 de maio de 2024

Dia Internacional dos Museus

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Ontem, Dia Internacional dos Museus. pelas 17 h, o Museu Marítimo de Ílhavo inaugurou a exposição “Alegorias do Mar na Cerâmica da Vista Alegre”, integrada nas comemorações do bicentenário da Fundação da Fábrica da Vista Alegre.

Esta exposição reúne um conjunto de peças (cerca de 130) inspiradas no mar e produzidas entre 1870 e 2024. Estará patente até ao dia 17 de Novembro.

Um mar de peças raras, de muito bom gosto, agrupadas por sub-temas, numa adequada e requintada montagem Sendo a Vista Alegre mais inclinada a fabricar peças escultóricas de outro teor e de decorar as suas peças, mais com paisagens a sépia e floreados coloridos, entrelaçados e relevados a ouro, com paciência, tempo e insistência, e graças à boa vontade de alguns coleccionadores particulares, a juntar ao espólio,  que esteve nas origens da fundação  do próprio Museu, a cedências do MHVA e outras instituições públicas, chegou-se à exposição que se apresenta.

Há uma peça que aí faz falta, maravilhosa, rara e funcional, à época – tinteiro, em forma de bergantim com jovem tritão, soprando num búzio, decoração a ouro, negro e pequenas flores, policromadas, pintada à mão. Só não está lá, por causa de um gato. Quem diria? Pertença de uma família ilhavense, que um dia se esqueceu do gato fechado em casa, este escolheu para seu brinquedo, estilhaçando-a, a valiosa peça, deixando-a sem restauro possível.

A exposição abre com a bandeja “Brigue Trocador”, inspirada em motivos marítimos, numa linha precisa, realçada a aguarela, oferta dos AMI ao MMI, neste dia, peça recente, com a marca do bicentenário – 2024. Uma espécie de pote “Mare Clausum”, e o búzio “Novo Inquilino”, 2024, também foram doação dos AMI, neste Dia dos Museus, enriquecendo o espólio museal e dotando-o de mais três belas peças relativas ao bicentenário da Fábrica da Vista Alegre.

Muitas vezes, nestes seis meses, a hei-de revisitar…uma dúvida, uma data, um pormenor…

Só para levantar uma pontinha do véu e aguçar o apetite… vista ao vivo, a exposição é muito mais apelativa.

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Filtro de água, palmatória e prato, de temática regional
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Não falte.

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Ílhavo, 19 de Maio de 2024.

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Ana Maria Lopes

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sábado, 4 de maio de 2024

ÚLTIMA CAMPANHA DA PESCA À LINHA. 1974.

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A prosa romanceada do mais recente livro de Manuel Martins, intitulado” Última campanha da pesca à linha”, foi elaborada a bordo do penúltimo navio da citada pesca  – “São Jorge”.

O primeiro episódio passa-se com o 25 de Abril, quando o navio “São Jorge”, navegava no canal com o mesmo nome, a caminho dos bancos da Terra Nova.

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“São Jorge” em S. Pierre, em 1974
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Desde que me comecei a interessar pela Faina Maior, já lá vão muitos anos, logo soube que, no ano de 1974, os únicos três navios que foram à pesca à linha, do bacalhau, foram o “O Ilhavense”, o “São Jorge” e o “Novos Mares, os três, navios-motor.

O “São Jorge” navegava serenamente, com mar de pequena vaga, a caminho dos mares da Terra Nova, a 22 de Abril de 1974.

Este navio, baptizara-o, eu, na Gafanha da Nazaré, com doze anos, e naufragara, por incêndio, entre a tripulação, com o imediato, Manuel Martins, que chegara a ver a morte, a 26 de Julho de 1974 – contrastes.

Depois de algumas pesquisas de fundos, para a pesca, a  primeira semana no Rocos fora proveitosa para todos. Mas, um dia, pela manhã, 26 de Junho, o “Ilhavense” emitiu um SOS, comunicando que tinha fogo a bordo. O capitão do “São Jorge” logo ordenou que fossem em auxílio do navio incendiado.  Em menos de meia hora, estava a 200 metros do dito navio, que já tinha o pessoal, dentro dos botes, na água, bem como a baleeira com os oficiais e a restante tripulação.

Um acidente!..., mas sem perda de vidas! Era um cenário desolador, para o pescador, já a salvo, ver o seu bote à deriva, para ser tragado pelo oceano. Entretanto, o “Novos Mares”, que estava mais distante, ainda chegou a tempo de salvar alguns náufragos, que, entretanto, foram levados até St. John`s, para ser tratado o repatriamento.

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“O Ilhavense”

Pelas condições climatéricas e pelas diversas notícias, chegadas de Portugal, o Verão, na Terra Nova, estava mesmo a ser um Verão quente…Muitas reuniões, muitas reivindicações, mutos problemas, mas nada se resolvia. Só o regresso a Portugal era o desejo dos tripulantes.

Era, pois, meio-dia de 26 de Julho do ano de 1974, quando os dois navios sobreviventes da frota branca, largaram de St. John`s. Era um adeus até sempre, na esperança de, no ano seguinte, regressarem, possivelmente, como tripulantes, a bordo de um arrastão.

Apesar de não serem as condições ideais, eram, contudo, boas condições para navegar para a terra-pátria.

Mal tinham acabado de comer a sopa do jantar, pelas 18 horas, sentiram a máquina parar. O ajudante, esbaforido, avisou: venham ajudar, há fogo na casa das máquinas!... Começou o capítulo o “naufrágio”, de todos o mais pungente e aflitivo. Todo o processo de salvamento para bordo do “Novos Mares” foi muito complicado e perigoso, mas o do imediato Norberto transcendeu tudo o que é narrável. O autor, Manuel Martins, apesar de o ter sentido na pele e na alma, optou por ser um narrador não participante, sob o heterónimo de Norberto, através de um narrador que conta, na terceira pessoa, o seu salvamento. Deixo para o leitor a avaliação de todos os pormenores e aflições. Já no “Novos Mares”, o Antenor disse para o imediato Norberto: Você salvou-se por um triz. É preciso ter uma força anímica muto forte para conseguir um feito tão audacioso.

Tendo atracado o “Novos Mares”, em St. John`s, o repatriamento dos náufragos seguiu-se nos trâmites habituais.

Sobrou o “Novos Mares”, que saiu da Terra Nova e chegou à Gafanha da Nazaré, sem peixe, carregado de sal, com a companha em greve, em inícios de Agosto de 1974.

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“Novos Mares”, à chegada…
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Terminava assim a epopeia da última campanha da pesca do bacalhau à linha, nos bancos da Terra Nova.

Ílhavo, 4 de Maio de 2024

Ana Maria Lopes