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Não deixemos de comparar. No ano passado debaixo de uma nortada levada da breca, assistimos à passagem da procissão da Senhora dos Navegantes, à ressaca da «ponte» de um arrastão costeiro, na Gafanha da Nazaré. Apesar do frio, tivemos a oportunidade de apreciar a procissão, calmamente, que nos pareceu, talvez, pela perspectiva, bastante mais bem organizada.
Ao passar pela boca da Barra…
Este ano, com o ensejo de a acompanhar pela ria, em barco moliceiro, a perspectiva e a emoção foram completamente diferentes e mais envolventes. A marola, a agitação das águas, o conjunto de embarcações diversificadas que lutavam por melhores visão e posição, a força da maré, o nevoeiro naquele jogo do «cobre/descobre», mas mais «cobre do que descobre», fizeram do Pardilhoense uma espécie de Nau Catrineta que tem muito que contar.
Um pouco ao molho e fé em Deus, salve-se quer puder. Emocionante a viagem! E o nevoeiro teimava em nos estragar a vida, ofuscando-nos a visão, impossibilitando imagens de qualidade e arrefecendo-nos as mãos cada vez mais engrunhidas.
Mas o desfile lagunar prosseguia.
A Jesus nas Oliveiras, em ria cinzenta e encapelada
As embarcações acompanhantes eram mais barcos de recreio de vários géneros do que propriamente barcos de pesca, em cenário de uma beleza maquiavélica.
Forte ondulação…
Como a turbulência aumentava para os lados de S. Jacinto com a força da corrente, não seguimos a procissão e passeámo-nos entre paredões apinhados de povo, posicionando-nos para a ver dar a volta ao triângulo e aportar ao seu destino, junto ao Forte.
E assim foi. O sol brindou-nos com uns raios luminosos que acenderam a paisagem – espectáculo fulgurante, na diversidade de embarcações, na presença de muito devotos, de muita cor, de códigos de sinais que embandeiravam os navios em arco, nas bandeiras portuguesas e, claro, em algumas insígnias clubísticas que não podiam faltar.
Flores multicolores, muitas, muitas flores, palmas hirtas ou vergadas em arco e outros enfeites adornavam o cortejo religioso.
As opas coloridas e esvoaçantes das irmandades também animavam o cenário, ao som dos acordes de uma banda gafanhense, que a aragem ajudava a propagar.
Não faltava também à chegada o estridente ribombar dos foguetes, que nos envolvia e estremecia a alma.
A diversidade de embarcações
Tudo isto tem um não sei quê de devoto, místico, profano e folclórico que se entrelaça e confunde.
Não faltou o Santo Amaro vindo da Capelinha da Costa Nova, altaneiro no seu meia-lua, num mar de flores, a bordo da rubra motora Faina Maior, lembrando-nos as duas fainas tão características da nossa gente, a pesca costeira e a longínqua.
O Santo Amaro, à proa
Também a motora Travesso procurava posição para acostar e apear a Senhora da Nazaré, que não podia deixar de estar presente.
Junto ao Forte
E o final do desfile anunciava o momento alto – da traineira Jesus nas Oliveiras, desembarcaria e seria levada em ombros a imagem da Senhora dos Navegantes, para a sua capelinha, no jardim do Forte da Barra.
A chegada da traineira Jesus nas Oliveiras
Chegados à Costa Nova, deparámos com um daqueles fins de tarde que nos aquecem. E para despedida, navegámos até ao cais-abrigo, para voltar ao CVCN, pousio do Pardilhoense, onde iria dormir uma noite calma, ao luar, depois de um desfile algo turbulento, mas previdente e desenvolto.
Imagens da autora do blogue
Ílhavo, 17 de Setembro de 2012
Ana Maria Lopes
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3 comentários:
Ontem fiz uma tentativa de deixar um comentário à suaa EXCELENTE reportagem,principalmente para recordar quando,a meio dos TRÊS meses que passava na Costa Nova,alguém organizava um passeio a S.Jacinto,mas NUM MERCANTEL,e se tinha de passar À VARA o estreito canal entre o "triângulo"e o Forte...E como,cheio de genica,peguei numa das varas e fiz a minha parte,ao longo da borda,vara apoiada no ombro!...E como uma escorregadela fez gorar o meu esforço,não sem antes esfolar o ombro e rasgar a camiseta no trambulhão!...Cumprimentos,"kyaskyas"
Uma descrição maravilhosa do evento.
Também o vivi com intensidade, a bordo de um barco moliceiro.
A procissão pela Ria oferece um belo espectáculo, de movimento, luz e cor. Este ano com o nevoeiro e a forte marola que se fez sentir, ofereceu cenários extraordinários, dignos de registo.
Obrigada pelo seu testemunho e pelas imagens aqui deixadas, verbais e visuais.
Grande abraço da Ria.
Etelvina Almeida
A Gafanha só copiou o que se passa no Tejo e Sado e foi divulgado ao longo do litoral pelos ILHAVOS... os CIRIOS eram o transporte de uma imagem ou vela de uma capela para outra em procissão...
Infelizmente Ílhavo tem aceitado perder a sua HISTORIA, TRADIÇÕES e DIVERSIDADE por um simples prato de lentilhas politicas...
Antonio Angeja
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