sexta-feira, 31 de julho de 2009

E o mito do Titanic continua... II



Então, o que mais me impressionou?

O ambiente lúgubre e escuro criado, a meu ver, apropriado ao ambiente que pretende retratar.
Os painéis expositivos são apresentados continuamente, em andares diversos, separados por escadas metálicas, que simulam o interior de um navio. Bancos de convés, criteriosamente colocados, permitem o descanso dos visitantes e a observação rigorosa das peças.
O ruído de fundo imita o barulho surdo das caldeiras a vapor, que, pela força da rotina, se deixa de ouvir!
Sempre que possível, há um apontamento referente aos passageiros, donos das peças em exibição:

- objectos íntimos, desde óculos, lorignons, lâminas e pincéis da barba, botões de punho, alfinetes de senhora e outras jóias mais requintadas;
- peças de vestuário, desde meias, papillons, um casaco de empregado de mesa, uma cartola de tecido acetinado;
- peças do próprio navio, como ornamentos luminosos, um querubim de bronze, suportes metálicos de bancos de convés, candeeiros em pêndulo, sinos que deram o alarme do acidente, telégrafo da casa das máquinas, telefones com altifalantes, megafone com que o Capitão Smith terá dado a última ordem para abandonarem o navio, coletes salva-vidas, manivelas de turco, etc…
- entre os objectos de cozinhas e diversas salas de jantar, conforme as classes, podiam apreciar-se grandes caçarolas e panelas, peças de louça e as tais “pratarias” decorativas funcionais, que englobavam os serviços de faqueiros.
Ainda nos foi dado observar garrafas de champagne, néctar da melhor qualidade, garrafas de cerveja e botijas de cerâmica.
Se citasse tudo, a enumeração seria infindável.

E o mito das “ditas colheres do Titanic” que, por Ílhavo existem, continua.


Exactamente iguais às que conheço, apenas com a estrela relevada da WSL, no cabo, só agora me foi dado observar.


Além das colheres de sopa, também de doce, garfos de servir, de dentes tremidos e concha de sopa, em plaqué, com o mesmo motivo.
Curioso! Os bilhetes de acesso à exposição são uma cópia fiel do acesso à viagem inaugural do barco, com o preenchimento de dados do/a passageiro/a.


Já que estava disponível, escolhi o bilhete de Millvina Dean, a última sobrevivente do naufrágio, que, há meses, morreu num lar de Southampton, com 97 anos de idade, a 97 anos da data do acidente. Como a sua morte sucedeu com a exposição já montada, o bilhete ainda não tinha actualizado o seu desaparecimento..--------------------------------------------------------------
A recriação da cena do iceberg, que pretende ser a mais forte, nem sempre é bem conseguida. No entanto, ao tocar a frigidez da falsa parede gelada, percebemos quão frias estavam as águas do Atlântico Norte, na noite do afundamento do Titanic, provocando muitas mortes por hipotermia, além do pânico e do afogamento. Fui informada de que a Exposição está patente ao público, ainda durante todo o mês de Agosto. Se puderem, não deixem de visitar!
Imagens – Arquivo pessoal da autora

Ílhavo, 31 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes

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domingo, 26 de julho de 2009

E o mito do Titanic continua ... I



Visitei a exposição Titanic The artifact exhibition, em Lisboa, no espaço Rossio, no mês passado.
É a terceira vez que visito exposições sobre o Titanic:
Em 1994, no Museu de Greenwich; no Mercado Ferreira Borges, no Porto, em 2004 e, agora, no Rossio, em Lisboa, em 2009.
A emoção, pela terceira vez, já não foi a mesma, mas, lá, tive oportunidade de apreciar muito mais peças do que em 1994, porque as expedições ao local do Titanic, para estudos e recolha de peças, foram-se sucedendo.
E aprende-se sempre mais. A meu ver, a exposição está dignamente montada, de uma forma séria e criteriosa.

Modelo do Titanic, à escala de 1/350


Resume, um pouco, a história do navio desde o nascimento da lenda da construção (1907), do design naval rigoroso, criado em 1908, do início da construção em Março de 1909, do dia do lançamento à água, em 31 de Maio de 1911, do seu acabamento até Março de 1912, da viagem inaugural com partida de Southampton, em 10 de Abril de 1912, até ao desfecho dramático do Iceberg à vista!, pelas 23 horas e 40 minutos de 14 de Abril de 1912.

A RMS Titanic tem-se empenhado em reunir, preservar e restaurar o máximo possível de objectos.
A história já foi contada e recontada, mas nunca de uma forma tão intensa e apaixonante como o fazem os artefactos diversos apresentados nesta exposição.
Os objectos estavam lá, na hora, pertenceram ao navio e às pessoas que navegaram nele. Não pretendem afastar a dor da perda dos passageiros, mas demonstram a importância de recordar e celebrar todos aqueles cujas vidas desapareceram com o naufrágio.

O achamento do Titanic contou com a colaboração de cientistas, aquanautas, historiadores, arqueólogos, engenheiros marítimos, arquitectos navais e conservadores de todo o mundo.
Antes da recuperação dos artefactos do Titanic, não havia uma especialização na conservação de materiais, retirados de uma profundidade de 3800 metros e sujeitos a uma pressão colossal!
Cada objecto exige um tratamento especial e a enorme variedade de materiais impõe a intervenção de especialistas não só em papel, mas também em têxteis, madeiras, metais, cerâmica, couro, etc.
Infelizmente, não existem técnicas de preservação do próprio navio, que está lentamente a ser consumido por micróbios que comem ferro. Parece impossível como a opulência do Titanic alimenta a sofreguidão de micróbios exíguos…

O que mais me impressionou?

(Cont.)

Costa-Nova, 26 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes

terça-feira, 21 de julho de 2009

Painéis de barcos moliceiros - Julho de 2009



Não pude deixar de visitar o Canal Central, em Aveiro, no passado domingo de manhã, para fazer alguns registos fotográficos de painéis de barcos moliceiros, aquando do seu concurso, integrado nas Festas da Ria.
Será uma recolha interminável…suponho.
Apreciem alguns deles, dirigidos a gostos diversos:

– Legendas sérias, de acordo com a imagem, que regista a antiga Estação dos Caminhos de Ferro de Aveiro:


– Registos que dizem respeito ao próprio barco moliceiro:



– A faina do sal raramente é esquecida:


– A malícia, também sempre presente, de uma forma mais dissimulada ou mais insolente:




Saboreiem e sorriam!!!

Troquei impressões com o construtor António Esteves de Pardilhó e constatei que José Manuel de Oliveira continua a ser o pintor de painéis preferido pelos proprietários das embarcações. Natural do Monte, Murtosa, e com alguma formação artística, já pintou umas centenas de painéis, a partir da década de noventa.

Fotografias – Ana Maria Lopes

Ílhavo, 21 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes

sábado, 18 de julho de 2009

Moliceiros voltam a animar a Ria - Julho de 2009



Cerca de duas dezenas de barcos moliceiros voltaram, hoje, a colorir as águas da Ria, numa regata que é uma referência nos eventos náuticos da região. Como vem sendo hábito, surge integrada na Festa da Ria e, além da C.M. de Aveiro, contou também com o apoio da Associação dos Amigos do Barco Moliceiro.
A partida foi da Torreira e a chegada aconteceu em Aveiro, junto da antiga lota.

Não nos foi possível acompanhá-la de perto, mas, de certeza que, a quem o fez, proporcionou imagens deste tipo, recolhidas em idênticas provas, nos anos 80.

Preparação da partida

Perseguição…

Que belo efeito!…


O vencedor da regata receberá um prémio no valor de 150 euros e cada participante com barco moliceiro ganhará 300 euros.

Amanhã, no Canal Central um júri escolhido para o efeito, classificará os painéis das embarcações. Os donos das que apresentarem pinturas novas receberão 450 euros e ao vencedor do Concurso de Painéis será entregue um prémio de 200 euros.


É, na realidade, um incentivo à manutenção dos poucos barcos moliceiros que ainda existem e um estímulo à renovação anual das pinturas, como era tradição.

Ao contrário do ano passado, em que a calmaria fez com que os moliceiros fossem chegando ao Rossio pelo fim da tarde, este ano, com a nortada fresca que soprou, apesar das precauções e cuidados havidos, ainda não eram quatro horas, já os primeiros barcos tinham percorrido o trajecto habitual.

Fotografias – Cedência de Paulo Miguel Godinho

Ílhavo, 18 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes
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sexta-feira, 17 de julho de 2009

João Zagalo, um doryman aguerrido - II



Contou-me uma história, que lhe deixou saudades, passada em Agosto, na Groenlândia, no Novos Mares, com o Capitão Pascoal:
O navio deu a emposta (mudou de sítio) para arriar mais cedo. Deu uma pesquisadela. Disse o Capitão:
– Para fora, não tem nada. Ide para o lado de terra!

«Vamos à vida, com Deus, vamos arriar!» – ordem do Capitão.

E a manobra do arriar começa. Eu, como era chasman (presumivelmente corrupção do inglês lastman), orientei, com outro camarada, a manobra de arriar.
Deduzi que o chasman era o dono do último bote do cimo da pilha, que não se desarmava. Tinha de ser um homem responsável, com jeito, traquejo e muita prática. Havia um chasman em cada pilha, que ajudava a arriar e a içar os botes e era sempre o último a partir para a pesca, depois de ter orientado estas lidas.
Eu, então, depois de botar as mãos no peitilho do avental para as aquecer, já que não trabalhava de luvas, remei de cu p’rà ré e fui p’ra fora, por estar mais desempachado (livre, disponível).
Larguei o trole e quando o grampolim chega ao fundo, comecei a sentir bacalhau na linha do grampolim. Bom sinal!

No meu dóri, era eu o capitão…


Acabei de largar, comi o pequeno-almoço que levava no foquim (peixe frito, pão e azeitonas), deixei passar uma hora e, em cada anzol, um bacalhau. Carreguei até ao bico do bote.

A propósito, recordámos as designações das cargas do dóri, consoante o espaço que o peixe ocupava a bordo:

fundo tapado, peixe a meio balde, peixe a balde, peixe à sarreta de baixo, sarreta tapada, uma popa de peixe, peixe à proa e peixe ao bico.

Fui descarregar e enchi outro bote de bacalhau.
O capitão chamou os botes para irem para mais perto daquele sítio.
Cheguei ao balão do trol, mas à terceira vez, nada. Era peixe a meia água, que passou e não voltou. Assim acontecia tantas vezes!
Este relato mostra a instabilidade, a precariedade e incerteza da vida.

Mas o João Zagalo não o esqueceu.

Dóris à espera de descarregar…


Trabalhou com os capitães João dos Santos Labrincha (Laruncho), de 1947 a 49 e de 1956 a 58, José Simões Bixirão (Ponche), de 1950 a 55 e António Pascoal, de 1959 a 1974.

Recordou alguns camaradas de faina, tal como o Manuel Pinto (n. a 26.1.1923 e já falecido), de Ílhavo, contramestre, também muito bom pescador e trabalhador fiel da casa, para a qual foi fazendo uns trabalhos específicos de marinharia, quase até ao fim dos seus dias.
Falei-lhe no vila-condense de gema, Jaime Pontes (n. a 10.12.1943), de alcunha Pião, de quem devia ter sido companheiro de lide nos anos de 1967 a 69, no Novos Mares, também bom pescador e bom amigo. Recordava-o.
Senti que, longe de aborrecer o João Zagalo, consegui proporcionar-lhe uma tarde agradável, cheia de recordações, duras recordações, mas, para ele, compensadoras.

Fotografias – Arquivo pessoal da autora

Ílhavo, 17 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes

terça-feira, 14 de julho de 2009

João Zagalo, um doryman aguerrido - I



Na semana passada, marquei um encontro na seca com João Teixeira Filipe, homem de boa têmpera, trabalhador fiel de Testa & Cunhas, durante 59 anos, desde 1943 até 2002.

João Zagalo (alcunha), seu nome de guerra, nasceu na Gafanha da Nazaré, a 28 de Agosto de 1924. Foi no início e crepúsculo da vida, carpinteiro naval, mas, no seu auge, foi um grande pescador do bacalhau, um audacioso, sabedor e afortunado homem do dóri. Tem um certo orgulho nas categorias que teve a bordo e no apreço que capitães, colegas e empresa nutriam por ele.

Recorda o leme e o Novos Mares


Na vida do mar, teve sustos… era inevitável, mas talvez nenhum daqueles que marcam para toda a vida… Concorda com o facto de a pesca à linha ter sido uma profissão árdua, muito dura e perigosa, mas tem saudades do mar, sobretudo do da Groenlândia, pelo muito peixe que lá se pescava e pelo tempo que lá fazia…recorda.

Começou, na adolescência, a aprender a arte de carpinteiro naval nos Estaleiros Mónica.

Numa ocasião, o Cruz de Malta estava em frente à empresa, virado à querena, para levar uma nova roda de proa, pois precisava substituída. O jovem Zagalo veio trabalhar para o navio, ao serviço do estaleiro, mas a vida do mar atraía-o e, assim, mudando para a carpintaria da seca, tinha a possibilidade de vir a embarcar. Ele e o Sr. António Cunha entraram em “acordo de cavalheiros”, como era normal. E o João Zagalo veio trabalhar para a primitiva carpintaria da empresa com o saudoso Zé Vicente.
Mas o apelo do mar era mais forte. E o seu sonho cumpriu-se.

Em 1947, embarcou de moço no Novos Mares, lugre de quatro mastros, a que ele passou a chamar o seu navio; mas, no ano seguinte, já foi de verde (pescador que ia à pesca pela primeira vez), no mesmo navio e pescador maduro, de aí por diante, até 1955.
De 1956 a 58, passou para o n/m São Jorge, que estreou.


De 1959 a 74, embarcou sempre no novo n/m Novos Mares. Aí foi um óptimo pescador e, nos serviços de bordo, como escalador, orientava a escala, tratando também cuidadosamente de todos os derivados: caras, línguas, samos e lombos.
Durante as viagens, no caso do Novos Mares, fazia quarto com o Capitão.

De moço, passou a verde e de verde a pescador especial (aquele cuja pesca ultrapassa os 200 quintais), estando sempre na categoria dos melhores pescadores do navio.

Depois da difícil viagem de 1974 e das greves de então, estava na altura de ficar em terra e aí, pela década de 90, muito contactei com ele, enquanto ia fazendo uns biscates na carpintaria, até 2002, ano em que se aposentou.

Em conversa, recordou alguns episódios de bordo.

– Sabe, menina (ainda me trata assim, imaginem), a melhor viagem que fiz foi no São Jorge (ali pelo ano 57) e foi mesmo a melhor do navio e a mais curta. Largámos a 31 de Agosto, viemos directos da Groenlândia e ainda fomos à feira de S. Mateus, em Setembro, em Viseu.
Era um bom navio. Dormia no beliche, à ré, e não fazia nenhuma “ringedeira”
(barulho que os navios de madeira quase sempre faziam).

(Cont.)

Ílhavo, 14 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Regresso do Mar, de Lázaro Lozano, enriquece MMI


Com conhecimento habitual de que “ia à praça”, em leilão de arte moderna, no Palácio do Correio Velho, um óleo de Lázaro Lozano, reforçado por mais um alerta da Direcção do Museu, a Associação dos Amigos do Museu de Ílhavo tinha de ponderar bem e de agir rapidamente, perante a peça em questão. Nem sempre aparece e a base de licitação não era exorbitante.
As hostes agitam-se, como habitualmente, aventam-se hipóteses, criam-se sonhos, de telefonema em telefonema, de e-mail em e-mail, de consulta em consulta!

Contactado “marchand” de nossa amizade, em Lisboa, estipulado um “plafond”económico, ia-se tentar conseguir o melhor e, ontem, primeiro de Julho, pelas 21 horas, o leilão começou.

O serão pareceu infindável, com a ansiedade criada, mas eis que perto da meia-noite, a boa nova chegou. Os Amigos do Museu, na perseguição de uma colecção de arte marítima representativa para a Instituição, tinham acabado de obter o óleo sobre tela, Regresso do Mar, de Bonifácio Lázaro Lozano, de 50 x 61cm, assinado, datado no verso (6.1990), como é hábito do Artista.

Regresso do Mar

Lázaro Lozano é um nome de referência numa colecção de pintura de temática marítima.
Nascido de pais espanhóis, na Nazaré, em 1906, morreu em Madrid, onde também tinha atelier, em 1999.
As suas figuras de pescadores e pescadeiras, que não enganam ninguém versado no assunto, dramáticas, têm um misto de realismo e de mística; são patéticas, atraem-nos e embriagam-nos.


Lozano reúne em si o sentido trágico da alma espanhola e o lirismo do sentimento lusíada – escreve Pamplona, acerca do Artista.

É intenção do Sr. Director do Museu que a obra de arte seja apresentada, publicamente, a 8 de Agosto, dia em que a instituição comemora os seus 72 anos de vida.

Já agora, lembramos sobretudo aos Amigos do Museu as obras de arte que a AMI ultimamente adquiriu, num espaço de dois anos e gostaríamos de as ver expostas, como é hábito em muitas instituições museológicas, com a intenção de as fruir, como obras de arte que são, e de tentar angariar mais adeptos para a Associação:

- “Marinha – Barcos na Ria de Aveiro”, de Cândido Teles (1921 – 1999), óleo sobre madeira, assinado e datado de 1941. Dim. – 17x 12 cm

- “Barco à vela “ de João Vaz (1859 – 1931), aguarela sobre papel, assinada. Dim. – 23x11 cm

- “Nazarena” de Lino António (1898-1974), 1929, desenho a lápis sobre papel. Dim. – 54x43 cm

- “Costa-Nova” de Fausto Sampaio (1893-1956). 1933. Óleo sobre madeira. Dim. – 50x62 cm

- E, agora, este Lázaro Lozano.

Não temos descurado outro tipo de espólio – foi o caso da construção do molinete do Faina Maior, a que também dediquei um post.
E aguardemos o dealbar de 2010, pois outras surpresas suceder-se-ão.

Imagem – Arquivo da leiloeira

Ílhavo, 2 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes
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domingo, 5 de julho de 2009

A ponte das Duas Águas, num domingo de Julho


Hoje, com o movimento que há, seria impensável.

Mas, atenção que as pontes não andam lá muito seguras, ultimamente, por este país! Basta nos lembrarmos da tragédia de Entre-os-Rios!

No dia 5 de Julho de 1951, um domingo como hoje (há 58 anos), a ponte de madeira das Duas Águas, que ligava o Forte à Barra, arriou, abrindo uma brecha de uns bons pares de metros, exactamente no momento em que passava uma camioneta de carga.

Milagrosamente, para lá do mergulho e afundanço da camioneta, não houve mais consequências nefastas, pois que os seus três tripulantes safaram-se a nado, depois de um grande susto.

Aspecto da ponte, após o acidente – 1951


As forças vivas do concelho deveriam, pois, actuar. Continuando a velha ponte a servir de passagem entre as duas margens da ria, várias dezenas de pessoas teriam a sua vida em risco!
Diz que se ouviram lamentos: – Agora… mais um compasso de espera para o comércio da Costa-Nova e da Barra. Quem compensa?

A tragédia não atingiu maiores proporções, porque a camioneta de passageiros que seguia atrás, pôde ser travada a tempo. O condutor, com perícia, conseguiu recuá-la para terra firme.

Na imprensa da época, lê-se com frequência – Ponte interrompida para obras, Ponte Farol /Barra sujeita a benefício…
Lembro-me dessa agruras, a que os mais novos achavam muita piada, mas os mais velhos nem tanto…
Uma camioneta de cada lado… e os passageiros tinham de passar a ponte a pé (expressão com que se brincava), com o tremelicar contínuo dos barrotes, que, nas junções, deixavam a água corrente e profunda, à vista, lá em baixo.

Durante esse interregno houve momentos, devido ao corte da ponte, em que nem esse tipo de travessia era possível!


Havia um plano para a construção de uma ponte em cimento armado que tardava. Só ficou pronta no Verão de 1975, com acessos ainda provisórios e em Março de 77, a velha ponte de madeira, foi demolida.

Mais uma imagem da ocorrência – 1951


Então, o serviço da travessia entre a Costa-Nova e a Gafanha da Encarnação era sobrecarregado, para o que não estava preparado.
Estavam, à época, ao serviço da travessia duas lanchas da carreira, a Rosa Branca e a Costa-Nova, que não aprovaram por muitos anos. Recorreu-se, de novo, às pesadonas barcas da passagem.

A Rosa Branca, à esquerda da Mota


Como a afluência era muita, lê-se na imprensa regional de então, a 1 de Agosto, que chegou a haver pequenos incidentes na travessia, em dois domingos seguidos.
“ (…) Estava atracada à mota da Costa uma lancha da carreira. O povo foi entrando e os barqueiros não notaram que um dos bordos da embarcação estava em cima da mota. Quando se afastou aquela, como o povo era muito, a lancha inclinou-se tanto que alguns passageiros e algumas bicicletas foram cuspidos à água.
Houve pânico, alarido, mas felizmente o acidente não resultou senão num banho forçado (…)".

Mas, pasme-se: - notícia de 10 de Agosto de 1951 anuncia: " (…) A ponte das Duas Águas já dá passagem a carros ligeiros (…)", apesar do travejamento continuar sempre a tremelicar.

Meu Deus! Parece que as obras eram mais rápidas pelos anos cinquenta do que agora, pois actualmente, na praia, no Verão, ainda continuam a perseguir-nos!...

Nos meus sete anos, recordo-me da ocorrência, mas sem grandes pormenores. Foi um desaforo na Costa-Nova! Quem, porventura, tiver um conhecimento mais profundo do acontecimento, poderá acrescentar algo mais. Agradece-se…

Saiba mais aqui.

Fotografias – Arquivo pessoal da autora

Costa-Nova, 5 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes

quinta-feira, 2 de julho de 2009

O iate Cysne


Às vezes, juro a mim própria, que não me "meto em bacalhoeiros" mais antigos, de que não há grandes dados, porque deparo com muitas dificuldades e começo a perder a paciência por pretender saber acontecimentos a que já não consigo chegar.

Mas, ao rever as minhas imagens, mais uma vez estaquei no iate Cysne, que não é uma foto ideal, mas que é bonita. E o nome, extremamente sugestivo.

Estava, há anos, a embelezar a parede do Salão dos Oficiais do actual Creoula, onde eu ia com muita frequência. Tanto a namorei que, na altura, o Amigo Tenente Gonçalves, a desmontou e ma emprestou para a reproduzir.

Assim a obtive, embora ela agora se encontre com facilidade, dada a quantidade de imagens que os meios informáticos nos disponibilizam.

O iate Cysne, de madeira, lançado à água a 2 de Julho de 1920, foi construído por António Bolais Mónica na Murraceira, Figueira da Foz, para o armador Junceiro, Mónica & Cª, a quem pertenceu de 1920 a 1923. Entre 1924 e 1934, pertenceu à Sociedade de Pescarias Amizade Lda., passando a Junceiro & Mesquita, Lda., de 1935 a 1937, todos da Figueira da Foz.

O iate Cysne

Foi -sofrendo -umas -ligeiras -alterações --nas- suas -características -principais, medindo mais ou menos 30 metros de comprimento, cerca de 7,50 m. de boca e 3 m. de pontal. Com uma tonelagem bruta de 125 toneladas, nunca teve motor auxiliar e, em 1935, passou a chamar-se Cisne.

Utilizado no serviço comercial de 1920 a 24, fez campanhas ao bacalhau de 1925 a 27, de 1930 a 34 e, depois, em 1936, alternando, em 1928, 29 e 35, com a reutilização no sector comercial.

Que se saiba, foram seus capitães João Francisco Bichão (1925), António Thomé Rosa Bichão (1926) e João de Deus (1927).

Tinha conhecimento de que se havia perdido no porto de Leixões, devido a temporal, em 27.01.1937, mas supunha não ter acesso a mais dados.

Eis senão quando uma foto-surpresa -me vem enriquecer o material já recolhido, onde se vê o Cisne, em segundo plano e o iate Harmonia Ligeiro, já a ser devorado pelo mar, em primeiro.

O iate Cisne, em segundo plano – 1937


É, então, possível, contemplar a perda do Cisne, já abandonado pela tripulação, que se deslocou contra as pedras do molhe norte de Leixões, onde se iria desfazer.

Temporal, esse, que assolou todo o litoral.
Foi o fim do Cisne. Não mais vogou sobre as águas.

Fotografias – Arquivo pessoal da autora e cedência de Reimar (acidente em Leixões).

Ílhavo, 2 de Julho de 2009

Ana Maria Lopes