quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Praias lagunares da Costa Nova

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Será que a Costa Nova terá sempre algo a acrescentar? Relativamente à «minha bíblia» sobre esta língua de areia que já nos deleitou muito mais, este “postal” não é novidade.

Há muito que vimos sentindo a falta de uma praia lagunar, num contacto aberto, directo, solto, franco, doce e libertador, com as águas correntes lagunares. Além de nos ter sido afastada da vista, uma boa dezena de metros, a ria, ainda nos foi levado esse refrescar directo dos pés ou dos corpos, nas suas macias águas. Isto consegue-se na ilha, na dita «Ilha Branca» de formação recente (pelos anos 70), mas convenhamos que aí abicar, a quem não tem embarcação, não é fácil.

Desde que a nossa estância balnear se começou a afirmar como pousio de veraneantes, o Bico começou por ser a primeira praia lagunar de renome, aí, até aos anos 30 do século XX.

Quem sabe, hoje, o que foi o Bico?

Um espraiado de areia, mais ou menos defronte ao actual e degradado parque infantil, enamorado de sol, apaixonado de água e luz, onde as beldades chapinhavam em grupo, para se sentiram mais afoitas. Foi a praia lagunar do tempo dos meus pais, onde chegaram a ser montadas, algumas, não muitas, barraquitas riscadas, para aconchego dos grupos de jovens veraneantes e possível troca de vestimenta molhada.

A actividade piscatória na zona era muito razoável e as embarcações, ao longe, na ria, pontilhavam-na de marcas mates ou brilhantes, empasteladas no casario embaciado ou reluzente da Gafanha da Maluca.

 

Postal da Costa Nova (Banhos no rio) – o Bico

Ainda reconheci este Bico, já só com uns restos de areia e vegetação (tramagueiras), onde nos reuníamos, em tardes mais ventosas, para apanhar búzios e «concharinhas» para colares, para jogar as cartas, o prego, o encarreirar ou o ringue. O banho, mesmo para as mais afoitas, já era impossível, dado que ao caminhar pé ante pé, logo atolávamos num lodaçal que nos atemorizava.

No nosso tempo de menina e moça, usámos uma praia lagunar mais a norte (entre 1935 e 70), a que foi dado o pomposo nome de Biarritz (praia famosa do sul de França), frente a um casario que começaria a nascer e a desenvolver-se no redondo conhecido ainda hoje por esse nome.

A pé, de bicicleta ou de bateira, para aí nos dirigíamos em bandos, quais gaivinas ou gaivotas esvoaçantes.

Saboreávamos-lhe a areia branca, macia, em declive, o sol quente, luminoso e acariciador, bem como a água corrente, límpida, agitada ou calma, consoante o vento ou a ausência dele.

A ria era o palco de um sem número de malabarismos – mergulhos corridos, saltados, pinoteados, braçadas em diversos estilos (bruços, crawl, mariposa). Mas, para deleite mesmo ao sabor da corrente, fruindo a quentura do sol, nada como boiar directamente na água ou em colchões ou bóias insufláveis.

Pelos anos 50, os vários banheiros da praia (Sr. Portugal, Abreu e Maiaia) ainda dispunham na faixa de areal, as suas barracas riscadas e coloridas, onde, mediante aluguer, nos vestíamos, despíamos e abrigávamos da canícula, vento ou nevoeiro em excesso.

 

Na Biarritz, em 1963

E, por aqui, foram despontando os primeiros amores que, ainda hoje, deixaram as suas marcas.

Logo a seguir ao aparecimento da Biarritz, começou a moda de San Sebastian (praia do norte de Espanha), uns trezentos metros mais a norte, junto à antiga seca de Lavadores, que não chegou a gozar do brilho do primeiro espaço.

 

 

Na enseada, ao fundo, avista-se San Sebastian.1967
 

A rapaziada, que fruía de belos mergulhos de dunas altas para água límpida e profunda, era mais a clientela de San Sebastian. Ficava, mais ou menos antes da actual ponte da Barra, frente à actual moradia do arquitecto Cravo.

Foram estas as praias lagunares da Costa Nova, até ao grande desfalque, a que foi submetida a ria, pelos princípios de setenta.

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Costa Nova, 23 de Setembro de 2021

Ana Maria Lopes

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