domingo, 26 de abril de 2009

Navio / Motor Inácio Cunha - II



A viagem inaugural do Inácio Cunha foi feita pelo Capitão José Gonçalves Vilão, bem como a campanha seguinte (1946). Por lá passaram, no seu comando, nos anos de 1947 a 49, Elias Andrade Bilhau, natural de Lavos, Figueira da Foz; João dos Santos Labrincha (Laruncho), de 1950 a 1955; Manuel da Silva de 1956 a 60. Entre 1961 e 1962, comandou-o David Calão Marques.
Na campanha de 1951, trouxe os náufragos do Rio Lima e/ou Paços de Brandão, que haviam naufragado, nesse ano.

Entrada em Leixões com náufragos. 14.9.1951


Parece-me ter tido uma existência pacífica, com as atribulações e perigos, inerentes àquela dura faina.

São da campanha de 1961, as fotografias que tenho o prazer de partilhar, que me foram gentilmente cedidas pelo amigo, João David, filho do Capitão David Calão Marques.

O Capitão David Marques, na asa da ponte de bombordo – 1961

O navio enfrenta um campo de growlers. Pela proa, a popa do n/ m Lutador


No ano de 1962, O Capitão David Marques declarou à empresa 11 162 quintais de bacalhau, de acordo com o seu diário de pesca, pelo que o navio abandonou a pesca e chegou a Aveiro sobrecarregado, pondo em perigo o navio, a sua carga, seus pertences e vidas humanas ( vide o 3º cliché do post anterior - 1962).
O que se fazia por mais uns quilitos de bacalhau, para ganhar a vida!!!!

Também Ernesto Manuel dos Santos Pinhal comandou o navio de 1963 a 1966, ano em que naufragou, a 28 de Agosto, por motivo de incêndio a bordo, quando estava prestes a completar o carregamento, nos mares da Gronelândia.

A tripulação foi acolhida a bordo do navio-motor Soto Maior, que a encaminhou para o navio-hospital Gil Eannes, a fim de ser repatriada.
Todos os Capitães, de quem me lembro e com quem convivi, foram nossos conterrâneos, com excepção de Elias A. Bilhau.


Nas tranquilas águas da Ria, na Gafanha da Nazaré, podem apreciar-se, em primeiro plano, o Inácio Cunha e, pela popa, o São Jorge, de braço dado com o Novos Mares; avista-se, em último plano, o Avé-Maria.

Imagens – Arquivo pessoal da autora, da Fotomar, da Foto Resende e de João David Marques

Ílhavo, 26 de Abril de 2009

Ana Maria Lopes

quarta-feira, 22 de abril de 2009

O N/M Inácio Cunha em fotografias...


As idas à Empresa, ao “secadouro”, à seca, embora hoje, já nada, lá, se seque, às vezes, são proveitosas, para a minha colecção de fotografias da Faina Maior. Só que as de hoje não vieram em altura muito oportuna: entre dois posts do N/M Inácio Cunha, do qual pensava que nada mais apareceria.

Solução: editá-las entre ambos. Já não têm grande cabimento nem num, nem no outro, e não se pode perder o seu valor documental. Vejamos:


No verso da foto, espírito de bom humor, anotou:
As quatro primeiras figuras de toda a festa, segundos antes do bota-abaixo do Inácio Cunha – 25.4.1945

Da esquerda para a direita, Mestre Manuel Maria Mónica, construtor, Sr. António Cunha, Gerente da Empresa, D. Adília Cunha, madrinha do novo navio e Sr. João Testa Júnior, também Gerente da Sociedade. Que sabor a uma época que não conheci!


A ponte do comando do Inácio Cunha


Comentário anexo à fotografia exprime com uma certa graça: Mais parece a ponte do comando de um cruzador inglez!!! – 25.4.1945


Um cliché tirado a meio navio, ali no cais da Gafanha da Nazaré, no dia da entrada, em Outubro de 1962, permite apreciar o navio bem no fundo, os sacos de lona das roupas dos pescadores e a arrumação dos dóris empilhados, no convés.
Não se podem perder estes instantâneos! Enriquecem a história do navio!

Imagens – Arquivo pessoal da autora

Ílhavo, 22 de Abril de 2009

Ana Maria Lopes

domingo, 19 de abril de 2009

Navio-Motor Inácio Cunha - I


O “Diário da Manhã” de 18 de Abril de 1943 refere que vão ser construídos catorze navios a motor para a pesca do bacalhau, em todos os estaleiros do País, com capacidade de pesca de 254 000 quintais de bacalhau (…), bem como (nomeia) os armadores a que os novos barcos ficarão a pertencer.

Cita “O Ilhavense”, da mesma época, que é o maior empreendimento de construção naval, desde há dezenas de anos; esta nova frota, que deve estar pronta dentro de ano e meio, é patrocinada pelo Ministério da Economia que lhe dará todo o auxílio.

A mesma fonte, de 11 de Janeiro de 1945, referencia: Em 1945 a frota bacalhoeira será aumentada de algumas novas e grandes unidades. Pode contar-se como certa a incorporação do Maria Frederico e do Inácio Cunha de Testa & Cunhas Lda., que descerá na carreira, no fim do corrente mês ou em princípios de Fevereiro.


O Inácio Cunha na carreira1945


O Ministro da Economia, em colaboração com a C. R. C. B. e com o Grémio dos Armadores gizou, em 1943, um plano de renovação da frota bacalhoeira, dando facilidades aos armadores, ao mesmo tempo que as Escolas de Pesca preparavam os pescadores da geração nova.

Chegou, então, o dia festivo para o navio-motor Inácio Cunha, o dia 25 de Abril de 1945. Tudo a postos para a grande cerimónia.
Como a maré para o bota-abaixo fosse só pelas 17 horas, a empresa armadora decidira oferecer, entretanto, a cerca de 200 convidados, um lauto muito embora tipicamente regional almoço, num salão dos seus armazéns.
Na presença de todos os membros do Governo, vindos de Lisboa, das individualidades civis e religiosas, locais, dos armadores e dos muitos convidados, tiveram lugar as cerimónias da praxe, nos estaleiros da Gafanha da Nazaré: discursos, agradecimentos, bênção do navio pelo Sr. D. João Evangelista de Lima Vidal, o baptismo com o partir da simbólica garrafa de espumoso contra a roda da proa da embarcação, pela madrinha, Sra. D. Adília Marques da Cunha.

Mestre Manuel M. Mónica num discurso inflamado e a madrinha do Inácio Cunha – 1945

(…)
Finalmente, o Sr. Ministro da Economia cortou o cabo da bimbarra, mas o navio manteve-se, por algum tempo, estático. Correm pressurosos os construtores e demais pessoal, para alguns trabalhos de emergência, e, passado algum tempo, o Inácio Cunha desliza serenamente na carreira e vai, nadar, tranquilo como um cisne, nas salsas águas da Ria.
Acenam-se lenços, estalam foguetes, a música executa um número alegre e os armadores e construtores recebem os abraços e parabéns do estilo. –
refere o jornal, “O Ilhavense”, de 2 de Maio de 1945.

O novo navio-motor, um dos primeiros do tipo CRCB., construídos por Manuel Maria Mónica, na Gafanha da Nazaré, media 52,72 metros de comprimento, fora a fora, 10, 44 m. de boca e, aproximadamente, 5, 50 m. de pontal. Dispunha de todos os aperfeiçoamentos modernos, incluindo telegrafia e telefonia, belas instalações para a tripulação (69 tripulantes e pescadores e três oficiais), dispondo de 57 dóris.

A propulsão era feita por um motor Deutz de 550 H.P., deslocando-se a cerca de 9/10 milhas horárias. A tonelagem bruta era de 775,42 toneladas e a líquida, de 494,83.
Por cálculos de construção, esperava-se que viesse a carregar nos seus porões, sensivelmente, 12 000 quintais de bacalhau.


O Inácio Cunha, frente à empresa – 1945

(Cont.)

Ílhavo, 19 de Abril de 2009

Ana Maria Lopes

terça-feira, 14 de abril de 2009

Rostos da pesca bacalhoeira... no ARGUS

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Com o Argus na Gafanha da Nazaré…presente, mesmo ao longe, pela imponência dos seus quatro mastros, tive vontade, ao serão, de reler o I sailed with Portugal' s Captains Courageous escrito por Alan Villiers e traduzido pelo caríssimo Amigo Capitão Vitorino Ramalheira. Não resisti a respigar uns curtos parágrafos do excelente texto.

Ainda menos resisti a evocar alguns dos rostos dos grandes homens da pesca bacalhoeira, no Argus, na campanha de 1950, eternizados pela notável objectiva de Alan Villiers.

(...) Cedo, na Primavera de 1950, fiz viagem com a frota de pesca portuguesa, de 32 veleiros, no Argus, gracioso lugre em ferro, de quatro mastros, construído em 1938 – 1939, um rei entre os navios portugueses (…).

O piloto, um jovem bem disposto, de 22 anos, fazendo a sua 5ª viagem, disse-me que era o Primeira Linha, Francisco Emílio Baptista, o campeão dos pescadores de toda a frota. Em média apanhava uma tonelada de bacalhau por dia. Uma tonelada por dia! Olhei para ele espantado, porque não fazia a mínima ideia de que o peixe podia ser pescado em tal quantidade, na pesca à linha.
Os companheiros do Francisco tinham uma piada acerca das suas façanhas – “Ele tem o seu próprio viveiro” – explicou o segundo piloto. – “Vai lá e tira o seu peixe!”

O primeira linha Francisco Emílio Baptista


(…) António Rodrigues, de 63 anos, soube-o depois, fazia a sua 43ª viagem aos Bancos. Era um velhote simpático, cara castanha, mas o seu corpo era ainda activo e ágil, como um jovem (…).

António Rodrigues faz leme


O pescador Joaquim Pedro Rolão


Alan Villiers


Espero que apreciem, tanto como eu, imagens e texto. Foi essa a minha intenção…ao rememorá-los.
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Fotografias de Alan Villiers – Cortesia da National Geographic Society

Ílhavo, 8 de Abril de 2009

Ana Maria Lopes
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segunda-feira, 6 de abril de 2009

O Argus entrou a barra de Aveiro

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A história do lugre Argus, enquanto navio bacalheiro (1939 – 1970), é sobejamente conhecida, e está bem narrada, quer em Portugal, quer no estrangeiro. Muito se deve a Alan Villiers e à sua viagem famosa no navio em questão, em 1950, de que resultaram A Campanha do Argus, o documentário com o mesmo tema, o artigo I sailed whith Portugal’s Captains Courageous, publicado no nº 5 da National Geographic Magazine, em 1952, bem como as belíssimas imagens conseguidas, que têm corrido mundo.

Foi a 1ª fase do Argus.

A Campanha do Argus – 1950


A segunda, embora menos conhecida, também já ocupou alguns pesquisadores, sabendo-se, então, em estudo publicado por António Manuel Gonçalves, na Revista da Armada de Março de 2005, que o Argus foi então vendido, em 1975, pela Parceria Geral de Pescarias, à empresa canadiana White Fleet Cruise Ships, por 7 000 contos. No entanto, esta empresa acabou por vendê-lo, no mesmo ano, ao Comandante Mike Burke, para companhia com sede em Miami, nos Estados Unidos, que procurava navios históricos, para fins turísticos.
Ao passar a ser utilizado para tal fim, esteve sujeito a várias e exigentes transformações.

Acima do convés, recebeu um novo pavimento. À ré deste novo espaço, ficava o local onde eram servidas as refeições, com vigias panorâmicas, que asseguravam aos passageiros, uma vista deslumbrante.
Dispunha, então, de 52 camarotes duplos e 3 camarotes de seis pessoas, todos eles com casa de banho. Relativamente ao aparelho, recebeu novos mastros e velas, e armava, enquanto navegava, em escuna americana.

Foi a 2ª fase do ex-Argus, Polynésia II.

Polynésia II, enquanto navegava…

Entrada, a reboque do Sella


É este o navio que entrou a barra de Aveiro, às 10h e 27 minutos, entre molhes, enferrujado, um pouco danificado e desmazelado, depois de uns tempos de paragem e da compra em leilão, em Aruba, pela Empresa Pascoal & Filhos, S. A., com sede na Gafanha da Nazaré.

Enfrentou longa viagem, pelo Atlântico, desde 13 de Fevereiro até hoje, a reboque do Sella.

A 3ª fase já começou… à espera de voltar a ser o Argus…

A acostar na Gafanha, frente à Pascoal

Vai ser, esperamos, uma caixinha de boas surpresas para os amantes do mar e de navios.

Felicidades para a Pascoal! Saudações marítimas para o velho/novo Argus.

Ler mais no D.A., edição de 7.4.2009 (notícia Ílhavo: Recuperação do “Argus” vai ter que esperar).

Fotografias – Arquivo pessoal da autora e de Reimar

Ílhavo, 6 de Abril de 2009

Ana Maria Lopes

sexta-feira, 3 de abril de 2009

As "viagens " do Avô Pisco - II



1921 a 1926 – Mudou para os navios da Praça de Aveiro, começando por comandar o lugre Silvina.

Lugre Silvina, frente à seca


O Silvina, lugre com motor, de madeira, foi construído em 1919 por Manuel Maria Bolais Mónica para a Empresa de Navegação e Exploração de Pesca, Lda., de Aveiro. Em 1928 passa a ser propriedade de Testa & Cunhas, Lda. Naufraga, devido a incêndio, em 1941, no Grande Banco da Terra Nova.

1927 – Foi capitão do lugre Laura, porventura, capitão orientador (?) e vigilante da reconstrução a que o navio foi submetido nesse ano, passando a ser em 1928, o Cruz de Malta.

Entre Laura e Cruz de Malta – 1927

1928 a 1937 – Capitaneou o Cruz de Malta.

A este lugre, dediquei um extenso post, neste blog.

O Cruz de Malta, em tempo de guerra…


1938 a 1942 (inclusive) - Fez a viagem inaugural no lugre de quatro mastros Novos Mares, sobre o qual já escrevi o post, O “velhinho” Novos Mares.

O Novos Mares a entrar em Leixões – Fotomar


Por informação do Jornal de Notícias de 8.12.1938, tive conhecimento de que o Novos Mares, no dia anterior, ao entrar a nossa barra e ao passar a restinga, encalhou, pelo que os restantes cinco navios, que aguardavam fora do porto, ficaram para o dia seguinte. Este encalhe, felizmente sem consequências, foi originado pelo lamentável estado da barra, agudizado pela não existência de motor, a bordo. Na campanha de 39, embora um pouco mais tardiamente, o Novos Mares já partiu, com o novo equipamento, indispensável.

E aí, depois de muitas procelas, maus bocados, aflições, preocupações, angústias, saudades da família, próprias deste tipo de vida rude e dura, ficou em terra, depois de trinta e quatro anos de mar, apto a, em 1943, iniciar as suas funções de Avô. Adorava-me, “estragava-me” com mimos, levava-me com frequência à chegada das redes, nas companhas da Costa-Nova e, amiúde, no quadro da bicicleta, à seca, na Gafanha da Nazaré. Bonacheirão, bondoso, humano e afável, empreendedor e trabalhador, entregou-se, após as fainas do mar, às visitas sistemáticas à firma Testa & Cunhas de que fora sócio-fundador, em 16 de Dezembro de 1927. As lides agrícolas ali, no quintal do Curtido de Baixo, ocupavam-lhe o resto do tempo. Deixou marcas profundas na minha existência e, ainda hoje, guardo, com carinho, alguns dos instrumentos náuticos de seu uso pessoal.
Foi curiosa a diversidade de navios em que ele embarcou. Daí, não ter sido fácil, mas atractivo e apelativo, articular as informações.

Fotografias – Arquivo pessoal da autora, com a colaboração de vários Amigos


Ílhavo, 3 de Abril de 2009

Ana Maria Lopes