domingo, 25 de outubro de 2020

A apanha do "crico" na Ria de Aveiro

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A nossa ria, desde muito cedo, foi rica em bivalves, tendo-se tornado numa riqueza piscícola, que deu subsistência a uma quantidade grande de pescadores, que mais se interessaram e dedicaram por aquela actividade pesqueira. O berbigão, a amêijoa, o burrié, e, até a ostra, em tempos recentes (avistam-se viveiros mesmo da minha varanda na Costa Nova), ali encontraram nas águas lagunares um bom habitat. A sua apanha, sobretudo do berbigão, na gíria conhecido por crico, é um cenário com que deparamos frequentemente, mesmo a partir da curva da Biarritz. Actualmente, esta captura não me tem atraído tanto, se bem que seja muito intensa (vê-se com frequência), porque as embarcações usadas já são quase as modernizadas chatas, em fibra de vidro, menos atractivas para mim.

Este ano, talvez com as dragagens da ria que revolveram os fundos, voltaram, em força, ao terreno.

Noutro dia, remexendo “os meus baús”, estes assuntos sempre me interessaram, encontrei umas imagens dos anos 80 do século passado, na Costa Nova, em que o berbigão era apanhado com duas cabritas, mas a bordo de que embarcações? Suspense… vejamos.

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Olha o belo crico. Ena tanto!
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Ena!... que quantidade de crico capturado para bordo de um dóri (sobras da pesca do bacalhau, à linha…), bem nítido, onde é possível   apreciar e anotar alguns pormenores.

O CRISTINA II era um dóri já adulterado e adaptado à pesca lagunar, com coberta de proa e painel de popa para aplicação de motor fora de borda, mas que ainda evidenciava, com clareza, o tabuado trincado, que sempre ostentava e o caracterizava. Também se vislumbra a peça metálica (o bronze), onde se enfiavam as forquetas, que sustinham em rotação, a parte central dos remos. E uma bela fateixa de quatro patas e quatro unhas, sobre a coberta da proa! É nítida e mete raiva!

A referida cabrita pode apreciar-se bem na mão do pescador, constituída por uma longa vara a que se prende a travessa de um ancinho metálico, de onde sai um arco em semi-círculo, que sustém um saco de rede de cerca de um metro de comprimento, com um rabicho, no fundo, que facilita a manobra do despejo do bivalve, depois de ter sido, esforçadamente, cravado e arrastado pelo fundo da ria, suportado no ombro arrojado do pescador.

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Dóri de popa cortada
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Imagem extremamente explícita da captura, em que a embarcação também costumava estar fixa a duas longas e pujantes varas. A bateira caçadeira que a imagem seguinte apresenta, nessa mesma época, também se dedicava à mesma faina.

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E agora, a bateira…
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Às vezes, interrogo-me – será que eu, na Costa Nova, pelos anos 80, ainda tão jovem, não tão teria nada mais interessante que fazer do que andar a “pescar” e fotografar pescadores nas suas fainas? Claro que tinha e ia alternando. Caso contrário, também não me alegrava, agora, de encontrar estas “pequenas relíquias” de um passado recente, ao vasculhar “os meus baús”.

O que encontrarei mais? Não sei, ainda não acabou…. Vamos a ver o que está a dar…

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Ílhavo, 25 de Outubro de 2020

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Ana Maria Lopes

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