segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Destino de um Barco do Mar - retalhos...

-
O chamado de o mais belo barco do mundo por Raul Brandão, não deixou grande memória viva, entre nós.
Quando pelos anos sessenta/setenta do século passado, estes barcos do mar, de quatro remos, começaram a deixar de operar, o seu destino seria o apodrecimento, junto das praias onde foram reis e senhores.
Tal aconteceu com o Senhora do Monte, que parece ter trabalhado na Torreira, de que não há qualquer eco.


 (…) O barco tem quatro remos nos quatro bancos: o do castelo da proa, o do remo da proa, o do remo da ré e o do castelo da ré. A cada um destes pesadíssimos remos se agarram quatro homens de pé nas estorveiras que ficam nos intervalos dos bancos, seis sentados e ainda outros, os camboeiros, puxando os cambões – todos ao mesmo tempo, todos com o mesmo ritmo. O revezeiro, que ordena a saída para o mar, manda também em cada remo. Na parte mais delgada remam os caneiros, que trilham o remo e fazem a voga, ajudados pelos segundos – regista Raul Brandão, ao visitar o nosso litoral, pelos anos 20…, desde Espinho até Mira, passando pela nossa Costa Nova.

Em todo o país, resta-nos um, albergado pelo Museu de Marinha, no Pavilhão das Galeotas e sorte tive em saber algo do seu historial através de dados e imagens cedidas pelo amigo Comandante António Bento, que ainda o presenciou no areal da Torreira e que se encarregou do seu transporte para o referido Museu.
É o Sto António, construído em 1971, em Pardilhó, pelo hábil Mestre Henrique Ferreira da Costa, conhecido pelo Lavoura. Não operou mais que quatro anos – até 1975.



No areal da praia da Torreira, pelos anos 70



Dimensões – comprimento, 15,80 m; boca, 4, 38 m; pontal, 1,24 m. Matrícula A-2116-C.
Foi comprado a David da Silva por 20 000$00, em 28.4.1980 por intermédio da Capitania de Aveiro. O transporte para Lisboa importou em 10 000$00, tendo sido restaurado no Museu de Marinha em 1982. Ei-lo:





Melhor ou pior destino teve o S. Paio da Torreira, acolhido e exibido dignamente pelo Exeter Maritime Museum, depois de votado ao abandono durante uns anos, na borda da ria.



No Museu de Exeter, nos anos 90
No Museu de Exeter, nos anos 90

Com a extinção deste museu, em 1997, por falta de verbas, ainda não consegui notícias do seu rasto, se é que o tem.

Que saudades não terá o S. Paio, da companhia das abegoarias, do auxílio das juntas de bois, da admiração dos pescadores e visitantes, dos mil sóis que se punham no mar, ao entardecer, enquanto se exibia no areal imenso, encharcado por um céu azul, azul, azul.



Postal de época – Torreira


Resta-nos o areal – nem isso, já que tem sido altamente galgado e engolido pelo mar ameaçador.


Ílhavo, 9 de Janeiro de 2012


Ana Maria Lopes
-

6 comentários:

marmol disse...

Esta narrativa faz-me reportar aos tempos da minha infância na praia do Furadouro, bem perto da Torreira.
Que saudades !...

Anónimo disse...

Pode ver informaçao deste barco en http://www.worldofboats.org/boats/view/xavega/54

Ana Maria Lopes disse...

Obrigada. Já consultei o link e, sempre colhi alguma informação.
Oxalá o barco esteja bem conservado!
Cumprimentos

...terra longe... disse...

O barco foi tristemente queimado, assim como outros barcos de Exeter.
Tomei conhecimento deste facto num artigo publcado em BAR International Series, Seafaring on the Ancient Mediterranean pg 83.
O que restou do espólio de Exeter parece ter ido para Douarnenez e para Eyemouth na Escócia, para um museu que contactei e me dispuz a corrigir as fichas que estão na net sobre barcos portugueses.
Ficaram muito interessados, mas até hoje não voltou a haver contacto. Não percebi se o museu continua aberto, ou não.
Carlos Carvalho

Ana Maria Lopes disse...

Olá Carlos:

Obrigada pela sua achega. O link que alguém me enviou permitia-me ver o barco e ler algumas informações, mas pouco mais.Pelos vistos, o Carlos tem dados mais seguros, visto que o implicaram a si mesmo. É uma pena...pois o que se há-de dizer. Havia, pois, uma referência a Eyemouth, na Escócia.
Mantenhamos e cuidemos o nosso único exemplar, no Museu de Marinha.
Ana Maria

Anónimo disse...

Ainda me lembro quando havia 2 de 4 remos,lado a lado,na Costa-Nova,e de um lanço em que chegaram à areia cerca de 200 corvinas,de um número maior que "rebentou"com o "saco"e conseguiu escapar.E ainda me lembro do modo rápido (3 voltas e a ponta do "estropo"entalada com o cabo de arrasto,presa pelo atrito das cordas húmidas...)como os boieiros,sempre a correr,se "atrelavam"no esforço comum de puxar a rede...
Cumprimentos,"kyaskyas"