Na semana passada, marquei um encontro na seca com João Teixeira Filipe, homem de boa têmpera, trabalhador fiel de Testa & Cunhas, durante 59 anos, desde 1943 até 2002.
João Zagalo (alcunha), seu nome de guerra, nasceu na Gafanha da Nazaré, a 28 de Agosto de 1924. Foi no início e crepúsculo da vida, carpinteiro naval, mas, no seu auge, foi um grande pescador do bacalhau, um audacioso, sabedor e afortunado homem do dóri. Tem um certo orgulho nas categorias que teve a bordo e no apreço que capitães, colegas e empresa nutriam por ele.
Recorda o leme e o Novos Mares
Começou, na adolescência, a aprender a arte de carpinteiro naval nos Estaleiros Mónica.
Numa ocasião, o Cruz de Malta estava em frente à empresa, virado à querena, para levar uma nova roda de proa, pois precisava substituída. O jovem Zagalo veio trabalhar para o navio, ao serviço do estaleiro, mas a vida do mar atraía-o e, assim, mudando para a carpintaria da seca, tinha a possibilidade de vir a embarcar. Ele e o Sr. António Cunha entraram em “acordo de cavalheiros”, como era normal. E o João Zagalo veio trabalhar para a primitiva carpintaria da empresa com o saudoso Zé Vicente.
Mas o apelo do mar era mais forte. E o seu sonho cumpriu-se.
Em 1947, embarcou de moço no Novos Mares, lugre de quatro mastros, a que ele passou a chamar o seu navio; mas, no ano seguinte, já foi de verde (pescador que ia à pesca pela primeira vez), no mesmo navio e pescador maduro, de aí por diante, até 1955.
De 1956 a 58, passou para o n/m São Jorge, que estreou.
De 1959 a 74, embarcou sempre no novo n/m Novos Mares. Aí foi um óptimo pescador e, nos serviços de bordo, como escalador, orientava a escala, tratando também cuidadosamente de todos os derivados: caras, línguas, samos e lombos.
Durante as viagens, no caso do Novos Mares, fazia quarto com o Capitão.
De moço, passou a verde e de verde a pescador especial (aquele cuja pesca ultrapassa os 200 quintais), estando sempre na categoria dos melhores pescadores do navio.
Depois da difícil viagem de 1974 e das greves de então, estava na altura de ficar em terra e aí, pela década de 90, muito contactei com ele, enquanto ia fazendo uns biscates na carpintaria, até 2002, ano em que se aposentou.
Em conversa, recordou alguns episódios de bordo.
– Sabe, menina (ainda me trata assim, imaginem), a melhor viagem que fiz foi no São Jorge (ali pelo ano 57) e foi mesmo a melhor do navio e a mais curta. Largámos a 31 de Agosto, viemos directos da Groenlândia e ainda fomos à feira de S. Mateus, em Setembro, em Viseu.
Era um bom navio. Dormia no beliche, à ré, e não fazia nenhuma “ringedeira” (barulho que os navios de madeira quase sempre faziam).
(Cont.)
Ílhavo, 14 de Julho de 2009
Ana Maria Lopes
5 comentários:
Boa noite.
Pois bem longa história de vida e de mar tem este senhor, um exemplo de que afinal a vida dura da pesca à linha tinha também as suas recompensas "interiores", pelo menos para alguns (eu acredito que sejam mais que "alguns").
Mais uma vez este seu artigo me é especial, pois o Sr. Zagalo conhecerá por certo o meu pai dos 8 anos que andou no n-m "Novos Mares". Falarei em breve com o meu pai sobre isto.
Aguardarei a sua continuação, pois de certeza que o Sr. Zagalo tem imenso que nos contar.
Atentamente,
www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt
Sempre histórias interessantes a justificar a visita regular. Bem haja...
LMC
Bom dia Dra Ana Maria e amigo Fangueiro,pois é, a Dra fês o favor de lembrar um bom argumento e,sobre o amigo João Zé Galo ,nome porque era conhecido o Sre .
Pois como tenho dito conheci bem o amigo Zé galo e posso dizer sem rodeios que era um Sre ,educado e calmo ,para aquela vida diria mesmo ,muito educado e muito calmo ,era bom marinheiro éra ele que organizava os quartos e tambem bom pescador e bom escalador ,mais tarde garfeiro ,enfim tambem conheci bem o Sre Vicente tambem ótima pessoa que eu tive o prazer de pelo menos duas semanas conviver com ele na descarga do navio Novos Mares .
Comprimentos de Jaime Pontes
Boa Noite!
Navegando por este imenso mar que é a internet, vim aportar a este espaço. Sou filha e neta de pescadores de olhão e cresci em Matosinhos, "terra de lobos do mar", por isso o mar faz parte da minha natureza.
Fiquei encantadada com o que encontrei neste "marintimidades".
Farei dele o meu porto regular de acostagem!
Um abraço
Esperança
Vejam o meu comentário em
http://www.pela-positiva.blogspot.com/
onde está um resumo deste artigo sobre o sr Zagalo.
JM
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