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No
jornal “O Ilhavense” de 13 de Novembro de 1927, a notícia NAVIO NO FUNDO
chamou-me a atenção. Passo a citar:
“No
domingo passado entraram na nossa barra nada menos do que seis navios dos que
regressavam da pesca do bacalhau.
Alguns
deles deram em seco na restinga, e ali se conservaram à espera de água para se
safarem
Na
madrugada de segunda-feira, caiu um valente temporal, indo o lugre “Encarnação”,
da firma Ribau & Vilarinho à garra, abalroando com o lugre “Senhora
da Conceição» do que resultou sofrer um grande rombo no casco e na amura.
Na
quarta-feira, como já tivesse águas para navegar, iam a dirigi-lo para a
“carreira”, quando o navio começou a ir a pique, afundando-se em poucos
minutos.
Os
tripulantes do navio afundado mal tiveram tempo de salvar as suas vidas e
alguma roupa, ficando todo o recheio e a carga do barco debaixo de água. O
navio está seguro em três companhias”.
Para
mim, o “Encarnação” tinha ido à vida!!!!!!!!!!
Mas,
um belo dia, passando os olhos pelo catálogo “A Frota Bacalhoeira” (1999), em lugre
“San Jacinto”, vislumbrei: Ex- “Encarnação” construído em 1919 em Pardilhó por
Joaquim Dias Ministro. Adquirido pela Empresa de Pesca
de Aveiro para a campanha de 1933, o “San Jacinto” na campanha de 1936 passou
a ser propriedade da Empresa de Pesca de São Jacinto, Lda.
Então,
o lugre “Encarnação” não se tinha afundado?
Avançando
nos jornais, deparei-me com esta notícia, no número de 8 de
Junho de 1930.
O lugre
“Encarnação” que em Novembro de 1927 se havia afundado dentro da nossa barra,
depois do seu regresso dos Bancos da Terra Nova, acabou de ser posto a flutuar
graças aos enérgicos trabalhos da casa construtora Mónica & Cª, Lª, a quem
foi confiado o salvamento do referido barco.
O
“Encarnação” que vai sofrer importantes reparações, destina-se a viagens de
cabotagem, voltando, provavelmente, à Terra Nova, na futura safra.
Uns
anos mais tarde, tendo adquirido os volumes da obra de João David Batel, “A
Pesca do Bacalhau”, 2018/19, resolvi ressaltar os momentos mais importantes da
vida do lugre “San Jacinto”, deixando mais de lado as curtas, mas
valiosas notícias de “O Ilhavense”.
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Foi
registado na Capitania do Porto da Figueira da Foz, em 18 de Março de 1937,
para o serviço da marinha de comércio e da pesca longínqua.
No
final desta campanha, foi apanhado por uma forte tempestade, tendo sido, o
contramestre Manuel de Oliveira Frade, de 28 anos, natural de Ílhavo, varrido
ao mar, para nunca mais ser visto.
Em
1939, partiu da Groenlândia sem saber da eclosão da Grande Guerra, porque não
estava equipado com aparelhagem de TSF, tendo sido a 10 de Setembro, visitado
por um submarino, de que um tripulante solicitou a vistoria dos documentos do lugre.
E depois de alguns pedidos, tudo acabou bem. Chegou para o susto.
Em
1940, ficou célebre a sua aventura, quando no norte do Banco Store, na
Groenlândia, foi apanhado por uma tempestade com ventos ciclónicos de sudoeste.
Viu-se obrigado a correr com o tempo, passando entre dezenas de icebergs,
de cuja existência se apercebeu mais tarde, quando navegou para sul, depois de
o tempo melhorar, para regressar à faina de pesca.
Em 6 de
Agosto de 1951, recolheu parte dos náufragos do lugre “Paços de
Brandão”.
A 25 de
Fevereiro de 1952, quando se encontrava no rio Douro, deu-se um incêndio a
bordo, que obrigou a uma reparação duradoura, num estaleiro do Porto.
Naufragou,
por água aberta, durante a campanha de 1952, no Virgin Rocks, na Terra Nova. Os
náufragos foram recolhidos pelo “Lousado”, tendo regressado a Portugal, quinze,
a bordo do “Cruz de Malta” e os outros foram distribuídos pelo “Ana Maria”,
“Labrador”, “Lousado “e “Júlia Primeiro”.
Afinal, o “Encarnação” que foi dado como perdido, na entrada da barra de Aveiro, em 1927, afinal, depois de algumas reconstruções, de alguns benefícios, mudanças de finalidades e empresas, e algumas peripécias complicadas de mar, acabou por viver mais um quarteirão de anos.
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Ílhavo, 4 de Maio de 2021
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Ana
Maria Lopes
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