quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Homens do Mar - José Marques de Oliveira - 55



José Marques de Oliveira
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Há muito pensava abordar o currículo marítimo do Pai da minha amiga Joana, mas, José Marques de Oliveira, de alcunha Tira o Sousa, foi ficando para o final.  José Oliveira, filho de António Nunes de Oliveira Sousa e de Maria Marques de Oliveira, nasceu em Ílhavo, em 23 de Dezembro de 1918. E a alcunha de Tira o Sousa? Foi-me contado que já que o sobrenome do pai era Sousa, ele também o seria. E assim pensou o garoto, até entrar para a Escola Primária. Ao escrever o seu nome completo, fazia-o como achava que se chamava mesmo. Então o professor recomendava-lhe – Tira o Sousa –, porque não és Sousa mesmo. E daí nasceu a alcunha.
Conheci-o apenas de o ver passar lá para os fundos do Arnal e a própria filha me revelou não saber muito da vida do pai, por desencontros, próprios desta ocupação marítima e da sua vida colegial.
Com cédula marítima nº 10. 698, passada pela Capitania do Porto, no Porto, em 16 de Abriu de 1937, teve uma carreira, na pesca bacalhoeira, de motorista.
Do casamento com Maria da Conceição Rocha da Silva, nasceu a filha Joana.
Com perto de 30 anos de mar, sempre em navios à linha, foi um pronto e fiel servidor da casa das máquinas.
Já me têm passado casos de marítimos de uma grande fidelidade a uma empresa; neste caso curioso, o Zé de Oliveira foi fiel à Sociedade Lisbonense de Pesca do Bacalhau, Lda., mas também foi fiel a três capitães ilhavenses, que sempre acompanhou nas suas mudanças de navio – só se pode concluir que, entre eles, havia uma boa relação de trabalho. Foram os capitães António Simões Picado, com quem fez doze viagens, José Teiga Gonçalves Leite, com três viagens e Elmano Ramalheira, com onze campanhas.
Começou, certamente, como moço, como era hábito, «pau para toda a obra», mas, a partir dos registos existentes desempenhou o cargo de moço, em 1937, no lugre-escuna Santa Regina, pertença, à época, da Empresa de Pesca de Portugal, Lda., com sede e secadouros em Ílhavo, da gerência de Francisco António Abreu e de Anselmo José Lopes Ferreira. O capitão era o conterrâneo António dos Santos.
Toca de rumar a Lisboa, de albaióis e ferramenta no saco, para servir de ajudante de motorista no lugre Labrador, até à campanha de 1943 (inclusive). Nas de 1944 e 1945, passou a motorista. O capitão sempre foi António Simões Picado, de 1938 a 1945, com excepção das viagens de 1943 e 44, em que o capitão foi o também conterrâneo Júlio Pereira da Bela, de alcunha Salsa.
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No Labrador, o 2º à nossa esquerda, Eduardo Labrincha e o cozinheiro Manuel Pereira
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No Labrador, o 1º à nossa direita, Eduardo Labrincha, Manuel Sarrico…
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João Celestino Chuva Bingre e Zé Oliveira, 1944/45
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Chegado o ano de 1946, aconteceu a viagem inaugural do navio-motor, de madeira, António Coutinho, para onde ambos se mudaram – capitão António Picado e Zé Oliveira, onde este, de 2º motorista, passou a primeiro.

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Navio-motor António Coutinho
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Com a sua característica boina, com jeito para as máquinas e outros serviços, de barbeiro, por exemplo, assim foi vivendo, a bordo, bem humorado e fotogénico.
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Corte de cabelo ao cap. Elmano Ramalheira
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O navio-motor António Coutinho fora um navio-motor, construído em 1945 para a Sociedade Lisbonense da Pesca do Bacalhau, por Manuel Maria Bolais Mónica, na Gafanha da Nazaré. Nele se mantiveram primeiro motorista e capitão António Picado, apenas com um interregno de 1952 a 54, em que José Teiga Leite liderou o comando do navio, até ao ano de 1955, em que Elmano Ramalheira passou a dirigir o navio-motor.

Na viagem inaugural do São Rafael, em 1959, ambos abalaram, naquele espírito solidário e de amizade a que já me referi, de saco às costas, para o convés do São Rafael, até 1965.
Este navio, já de ferro e de outra dimensão e comodidade, foi construído para a mesma sociedade armadora, pelos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, em 1959.
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Navio-motor São Rafael
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Na safra de 1961, um triste episódio se passou, que não teria sido nada fácil de suportar pelos camaradas de bordo e ainda menos de comunicar à família.
No dia 22 de Abril, José Augusto Bichão Gago, nascido a 15 de Agosto de 1939, filho de Augusto Bichão Gago e de Evangelina Rainha Bichão, residentes na Rua Direita, em Ílhavo, de 21 anos, perdera a vida por afogamento, na Terra Nova, quando ia iniciar a pesca no seu bote. Aluno da Escola de Pesca, tinha feito dois anos moço, quando se ia estrear como pescador verde. Triste acontecimento, em que o mar arrepanhou para as suas funduras, o corpo de um jovem, para sempre.
Noutro dia em que passava pelo cais da Gafanha sempre recordando memórias, em frente a instalações da CNCB, chamou-me a atenção o nome de um navio, São Rafael, abandonado, enferrujado e degradado. De facto, era o São Rafael a que me venho referindo, depois de ter passado por diversas transformações e registos.
O nosso Zé de Oliveira ainda passou uns bons anos por Ílhavo, onde saboreou o tempo de aposentação, que se concretizou em 1972.
Deixou o mundo dos vivos em 2 de Dezembro de 1990, com 72 anos de idade.
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Ílhavo, 16 de Abril de 2019
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Fotos cedidas por Joana São Marcos
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Ana Maria Lopes-

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