quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Romaria do S. Paio da Torreira




Em fins de verão, na zona lagunar, as festividades religiosas vão-se sucedendo: Senhora da Boa Viagem no último domingo de Agosto, no Torrão do Lameiro, S. Paio da Torreira, dia 8 de Setembro (e dias anteriores ou seguintes), procissão fluvial da Nossa Senhora dos Navegantes, em meados de Setembro, na Gafanha da Nazaré, Nossa Senhora da Saúde, na Costa-Nova, no último domingo de Setembro, Nossa Senhora das Areias em S. Jacinto, no primeiro domingo de Outubro e mais uma ou outra santidade espalhada pela região. Para muitas destas festas, o barco moliceiro era o meio de transporte favorito, porque também servia de casa nos dias de romaria. Esta tradição com o desenvolvimento de estradas e meios de transporte tem vindo a acabar. Mais sorte tem o S. Paio da Torreira que ainda é o ponto de encontro do maior e mais variado número de embarcações.

S. Paio – Anos 80


Até o nosso prémio Nobel Egas Moniz no seu livro de memórias A Nossa Casa não deixa de referir o encanto do S. Paio:

Na festa de S. Paio, a grande romaria da gente ribeirinha, a ria coalha – se de barcos que provêm de todas as freguesia marginais. Abundam os moliceiros lindamente embandeirados (…) que formam na Torreira a frota da alegria.
São as famílias e amigos do proprietário do barco que o enchem de raparigas airosas, de olhos escuros e tez morena, e de rapazes desempenados e garbosos, tisnados pela maresia.

O S. Paio é representado pela figura de um menino e está ligado às gentes que fazem da pesca o seu principal sustento, mas não só. Até porque na região a pesca interpenetra a agricultura numa simbiose perfeita do homem com a natureza: terra, ria ou mar. Quem não se lembra do Joaquim Ruivo, exemplo perfeito desta interpenetração? – tem gado e intensa vida de lavoura, no seu moliceiro, pelo menos, apanhava junco e moliço para uso pessoal, trabalha nas reconstruções ou “restaurações” dos barcos como ele lhes chama, decorava barcos e constrói as bonitas cangas vareiras.

A ligação do santinho padroeiro ao vinho, sobejamente conhecida, também terá a ver com a plena época das vindimas, em que a festa se realiza.

Quadra:

Ó S. Paio da Torreira
Ó milagroso santinho.
Hei-de cá voltar p´ró ano
Lavar o Santo com vinho.


Daí a ligação um pouco aberrante da relação entre o divino (as crenças, a fé) e o profano, cenas não das mais recomendáveis que os romeiros são levados a cometer como um desacato mais agressivo ou discussão mais acesa. Tão depressa o peregrino se entrega aos mais profundos actos de devoção, como apanha uma enorme borracheira e pragueja por tudo quanto é canto e esquina. Será em homenagem ao S. Paio milagreiro que transformava o precioso néctar em líquido santificado, segundo uma tradição antiga em que o santo era banhado em vinho?

Vide ONDE SE DÁ CONTA DOS ACONTECIMENTOS DO "ROUBO" DO S. PAIO DA TORREIRA .

Esta dicotomia de sentimentos está constantemente presente na decoração dos barcos moliceiros. E também a presença da Virgem na proa dos chinchorros e da Nossa Senhora ou da cruz de Cristo na bica do barco do mar não serão também indícios de uma forte religiosidade?

Eis alguns painéis de moliceiros em que o motivo central é religioso, neste caso, a representação do S. Paio da Torreira, celebrado nos dias 5 a 8 de Setembro.


S. Paio

O S. Paio da Torreira

“S. Paio da Torreira”

“Terás sempre lugar no meu coração”


Mais uma vez, este ano, a romaria do S. Paio já tem programa de festas. São destaques do cartaz: a procissão, o fogo de artifício no mar e na ria, regata de bateiras (à vela), a corrida de chinchorros, as rusgas e a regata de moliceiros. Esta e o concurso de painéis têm lugar no dia 7, domingo, respectivamente às 16 horas e trinta e 10 horas da manhã.
Na segunda-feira, dia 8, dia de S. Paio, às 10 horas realiza-se a tradicional missa campal, seguida da habitual procissão.

Fonte: “Murtosa – Uma terra a descobrir – Romaria do S. Paio da Torreira”, texto de Ana Maria Lopes e Fotografia de Carlos Pelicas

Fotografias do Blog – Arquivo pessoal da autora

Ílhavo, 4 de Setembro de 2008

Ana Maria Lopes




2 comentários:

almagrande disse...

Parabéns, belo post a assinalar a data.obrigado.

Marieke disse...

Ana
Como sempre os teus escritos são muito bons,mas a história do roubo do S. Paio é hilariante .ahahahhahahahhahah..