A propósito do incêndio que houve, na noite de 23
para 24 do mês passado, no chamado Palacete dos «Cartaxos» e, tendo lido que
ele, possivelmente, teria sido mesmo sede do Sindicato dos Mareantes, andei a
catar este texto de Diniz Gomes (que sabia existir), que agora respigo. Tardou,
mas apareceu:
Ílhavo – terra essencialmente
marítima, possuindo cerca de cento e cinquenta oficiais náuticos e mais de três
mil indivíduos que do mar tiram o seu sustento num árduo e arriscado mister tão
cheio de riscos e privações, quer tripulando a maioria dos nossos navios
costeiros e de longo curso, quer ocupando-se no trabalho da pesca nos bancos da
Terra Nova, nas armações de Setúbal, Sesimbra, Matosinhos e ainda nas companhas
de arrasto das costas do litoral – devia possuir também uma associação de
classe marítima para acompanhar o movimento associativo dos tempos modernos e ter quem pugnasse pelos interesses e regalias dos homens do mar.
Assim o entendeu um grupo de patrícios nossos e, no desejo de verem realizado o ideal almejado com tanta ansiedade e preenchida a lacuna que tanto se fazia sentir, lançou mãos animosas à obra, em princípios do ano de 1899.
O esforço foi coroado do melhor êxito, congregando-se todas as vontades, reunindo-se os melhores elementos e unificando-se todos os alvitres, por forma a que, no dia 19 de Março daquele ano, era inaugurada a nova associação com o título de Grémio Marítimo Ilhavense.
Em 11 de Março do ano corrente, a convite da Liga Naval de Lisboa, o Grémio ligou-se àquela importante corporação, seguindo assim o exemplo de outras agremiações congéneres do país.
As vantagens desta fusão são incalculáveis, porquanto ninguém ignora a importância e influência política e social da Liga e os recursos de toda a natureza de que ela dispõe, benefícios de muita valia que se reflectem nas juntas locais. Disso são testemunho eloquente os trabalhos, com resultados práticos, do último Congresso Marítimo, brilhantemente levado a cabo ultimamente pela Liga, em Lisboa.
A Junta Local de Ílhavo encontra-se actualmente florescentíssima, com vida desafogada e futuro animoso, possuindo, no melhor prédio da vila, uma magnífica instalação, cuja estampa hoje se publica.
Sede da Liga Naval em Ílhavo
É grande e distinto o número dos seus associados, que, pela reforma ultimamente introduzida nos estatutos, podem ser de todas as classes sociais. Desta arte, ali se reúnem num fraternal convívio – postos de parte estultos preconceitos de desigualdades de nascimento e posição – desde as pessoas mais gradas da terra, ao mais rude e modesto homem do mar. E não é consoladora e simpática esta confraternização de todos os nossos patrícios?
Ílhavo… mais pobre, além de outras valências que o prédio teve.
Ílhavo, 21.10.1903
DINIZ GOMES
Cliché do periódico Mala da Europa
Ílhavo, 5 de Dezembro de 2015
Ana Maria Lopes
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1 comentário:
E quem é que sabia disto???
Ainda bem, que há sempre alguém... pela minha parte, ... obrigado!
JR
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