domingo, 10 de agosto de 2014

AMI enriquece espólio pictórico do MMI

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A 8 de Agosto, em que o Museu de Ílhavo cumpriu as suas 77 primaveras, a AMI teve o prazer de enriquecer a colecção de pintura, que, desde o ano passado, se exibe em sala apropriada para o efeito, – o melhor dos nossos maiores e não só…. Temas marítimos ou lagunares, dentro de determinadas correntes que se consideram essenciais na colecção.
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Retrocedendo no tempo, sabemos que o Museu possui dois óleos que representam camponesas de Ílhavo, no seu trajar.
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O primeiro, de J. P. Ribeiro, pintura a óleo sobre madeira, Camponesa de Ílhavo, assinado, datado de 1869 (no reverso), 39x29 cm. Ei-lo:

Camponesa de Ílhavo, 1869

O segundo, Camponesa de Ílhavo (o mesmo título), revela-nos também o rico traje tradicional da camponesa de Ílhavo, em finais do século XIX. Esta mulher também enverga um chapeirão de feltro preto debruado a cetim, de abas bastante largas, soerguido por um lenço vermelho lavrado. Camisa branca de mangas folgadas, saia e colete, escuros. Este, de fazenda ou até mesmo de veludo, prende no peito por abotoadura de prata, de par.
Bonita algibeira debruada e brincos compridos de ouro dão um último toque ao vestuário que enobrece a camponesa, que, no entanto, se apresenta descalça. Cordão de filigrana ao pescoço completa o adereço.
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Camponesa de Ílhavo, 1875*
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É um óleo sobre metal de 1875, assinado, datado, 42,5x32 cm., da autoria de Francisco José Resende (1825 - 1893). Foi adquirido em 1958 pela CMI ao Sr. Albano Pinto da Cunha Ferreira, do Porto, por 2.500$00.
Pelo início dos anos 90, o Arquitecto Quininha, de quem fui amiga, trouxe-me, carinhosamente, um postal da Camponesa de Ílhavo, também reprodução de óleo de F. José Resende, que encontrara à venda no então MNAC. Guardei-o, mas agora, aprecio-o mais. O tal quadro vem citado, verifiquei, no Dicionário de Pintores e Escultores Portugueses de F. de Pamplona.

Postal do MNAC

Este óleo sobre tela, de 66x47 cm, datado de 1867, representado no postal, que é suposto estar nas reservas do actual Museu do Chiado, enriqueceria um pouco mais a nossa colecção, mas as pertenças de cada museu são para serem respeitadas, salvo raras excepções de depósito ou cedência. Algumas semelhanças e algumas diferenças.
Talvez pelas cores empasteladas de uma luminosidade sombria, e pela elegante posição da figura em causa, é de uma nobreza e beleza extraordinárias. Parece demasiado rica e nobre para camponesa. No entanto, também está descalça… trajando de modo perfeitamente idêntico.
O grande pintor Francisco José Resende interessava-se mesmo pelo traje da camponesa de Ílhavo – pelo menos, são-lhe conhecidos três quadros, sobre o mesmo tema…
Até agora, tudo esclarecido, quanto às camponesas… Qual terá sido, então, a surpresa dos AMI, pra o MMI?
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Recuemos a Dezembro de 2013… Ali pelo dia 13, fui informada por uma mensagem privada de FB, por alguém sabedor, que a pintura de José F. Resende intitulada Costume de Aveiro-Vareiro ia ser vendida no lote nº 146, na leiloeira Cabral Moncada Leilões, no pretérito dia 16 do referido mês. Com as dimensões de 55 x 40,5 cm., é assinada e datada do Porto, Fevereiro de 1863. A base de licitação oscilava entre os 1.800 e os € 2.700.
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O informador, sabedor, mais dizia que se tratava de uma pintura iconograficamente importante para a região, vendo-se um homem com o tradicional gabão e barcos moliceiros na ria (?). Mais dizia que existiam pinturas do mesmo autor Camponesa de Ílhavo-Vareira, no Museu do Chiado em Lisboa e no Museu Marítimo de Ílhavo.
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E tudo isto era verdade. Mas, que fazer?
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Sozinha, diante do computador, nem tugi nem mugi. Entupi. Não disse nada. Quem não tem dinheiro não tem vícios, como sói dizer-se, e a situação económica da AMI, às voltas com a vinda da bateira ílhava para o museu, da sua oferta e do seu pagamento não era das mais folgadas. Pensei «cá com os meus botões» – talvez não se venda e volte a ir a leilão, numa altura mais solta, para nós, Amigos do Museu.

O Homem do Gabão, 1863

A preocupação e a azáfama com a bateira eram grandes e, olha…, o quadro ficava entregue ao destino – é que o «homem de gabão» não era mais nem menos do que um ílhavo e os barcos que se viam eram tão só umas silhuetas de umas ílhavas (a situada em último plano, com pormenores de velame muito curiosos) brochadas a negro pelo pincel do pintor de oitocentos.
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Com as contas mais revigoradas, por Fevereiro, soubemos, com enorme surpresa, que o quadro tinha sido retido, para uma aquisição posterior. E assim foi, mais um rombo na economia da associação, mas o homem de Ílhavo, de gabão castanho, de barrete escuro, de manaias e de camiseta esbranquiçadas, era «nosso».
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Além do mais, iria acasalar com a mulher de Ílhavo, há décadas, celibatária.
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* Entretanto, o óleo em causa recolheu a reservas, para ser sujeito a um restauro minucioso, o mais brevemente possível, a expensas dos Amigos do Museu.
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Ílhavo, 10 de Agosto de 2014
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Ana Maria Lopes
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