segunda-feira, 3 de junho de 2013

Impressões sobre o «Amores de Ria»

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Do que gostei mesmo, ontem, na Costa Nova, alongada no sofá, ao ler a nova novela, foi que o livro Amores de Ria, com a sua capacidade de ficção, conseguiu fazer-me visualizar o que teria sido uma viagem de moliceiro com pai (arrais) e filho (moço) desde as Folsas do Boco, pelos anos 50 do século XX até Ovar, cais da Carregueira, onde fora descarregar umas pipas de vinho, que tinha embarcado no entreposto da Ponte de Fareja, o que, às vezes, também costumava ser tarefa de o moliceiro. O João da Vaca, como era conhecido, arrola, pormenorizadamente, todos os entrepostos do antigamente por onde passava, as obsoletas pontes até Ovar – o que o obrigava a arriar e a içar  vela e  mastro – e, depois, o retorno, de novo, até ao Bico da Murtosa, onde, pacatamente viviam a Cristina (sua querida mulher) e uma ranchada de filhotes pequenos. O Tonito, nos seus débeis 11 a 12 anitos, para auxílio da família, já era moço do pai, já tinha preocupações de homem feito.
 
Pressuponho que era a vida desse tempo, que também não vivi, mas de que tive «ecos nos olhares». O autor tem o perfeito conhecimento do vocabulário técnico da embarcação e seus aprestos, o que nem sempre acontece, da vida de bordo, das suas manobras, do que é apanhar uma maré de moliço, sem esquecer as rudes ementas desses parcos tempos, cozinhadas nas painas da proa, em tosca e negra panela de ferro, e dos sentimentos que perpassam no coração daquela gente – pai, mãe, Tonito, irmãos, irmãs, vizinhos, amigos. De volta a casa, encontrando a sua Cristina doente, como todo o homem de mar e ria, crente fervoroso, promete a oferta  de uma barriga de cera, à Senhora da Saúde, que estava próxima, se a sua cara mulher se curasse. E assim foi – deu-se o milagre – e a sua amada ficou boa. Mais um pretexto agradável para o autor nos recontar a festa, evocando uma romaria da Senhora da Saúde daqueles tempos, meados do século XX, com todas as privações e sacrifícios, mas belezas e satisfações a que tinha direito, num hino ao amor à família.
 
E são assim os Amores de Ria, entre um velejar de feição ou ziguezagueado, não sem evocar, de passagem, a arte da xávega, na Costa Nova, as marinhas da Malhada com a sua actividade dos barcos saleiros, bem como algumas bateiras de pesca com que se iam cruzando. Espero com este meu sincero «opinar» não tirar o interesse a futuros e possíveis leitores, mas sim despertá-lo ainda mais. Parabéns ao autor, sem esquecer a beleza e a propriedade das aguarelas, bem como da capa do livro, entre tons de verdes, azuis alilasados e róseos, que traduzem toda a magia da transformação da ria, pela paleta de Adélio Simões.

Sessão de autógrafos

 

Fotografias – Arquivo pessoal da autora

Ílhavo, 3 de Junho de 2013

Ana Maria Lopes
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