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Em visita fortuita às
reservas do Museu, deparei com uma grafonola antiga e incompleta com discos de
vinil, de 78 rotações, que me fixou o olhar, que logo transmitiu o sinal à mente.
Depois de observar o necessário, a conversa girou em torno da grafonola, a
propósito de umas cavaqueiras tidas
há muitos anos com o velho lobo do mar Capitão Almeida, assim era conhecido.
Mais tarde foi-me dada a
possibilidade de fotocopiar uns apontamentos dele, que possuo, a que recorro
com alguma frequência. E assim foi. No Museu, contei aquilo de que me lembrava
e, em casa, lá fui a esse baú, tenho
vários, e dei logo com o que queria.
Confessou-me o Capitão Almeida que, no primeiro ano de comando da pesca do bacalhau no lugre Argus (em 1933), mais tarde o Ana Maria da praça do Porto, após reconstrução sofrida no estaleiro de António Maria Mónica, na Gafanha da Nazaré, transmitiu música a bordo.
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Fui o primeiro capitão a dar música a bordo, para o que comprei, por intermédio
do meu irmão mais velho, Manuel, uma caixa de música com corda manual, que
ainda possuo, (e alguns discos de vinil antigos), com que contemplava os
pescadores, em dias de boa pesca e bom tempo. Dizia-se que dava azar música a
bordo (dizeres do povo), visto que no Titanic,
quando se afundou (1912), a orquestra tocava a bordo.
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Pensei nisso – continuou a conversa – o que me fez, um dia, em que a pesca não
estava a correr bem, partir o disco da Ramona, da Samaritana e outros de que
gostava muito.
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Mas nunca desisti de dar música, até convencermos os armadores da Parceria
Geral de Pescarias, Lda. a fazerem instalação eléctrica de música com
altifalantes para o convés.
A
música animava muito a companha e, muito principalmente, durante a escala,
último e árduo trabalho a bordo, diariamente, depois da pesca, quando o tempo
estava bom. Foi uma lição para os navios de outras companhias, em que os
capitães também gostariam de música.
Os
capitães da Parceria Geral de Pescarias, Lda. podiam, pois, considerar-se
precursores da música a bordo sem maus presságios para a pesca. Quantas vezes,
através dos nossos postos emissores enchemos o espaço de música, que outros
navios, ainda sem instalação emissora, ouviam com agrado.
Mais
tarde, foi-nos proibido pelo Gil Eannes,
porque de terra se queixavam que interferíamos nas comunicações do correio e
outras. Teria sido?
Mas,
só para bordo, a coisa não falhava por intermédio de altifalantes.
Foi à volta deste episódio que, na hora lembrei, junto da grafonola, que a nossa conversa rodou.
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A prova tinha passado por
mim, pois «aquela grafonola» tinha sido trazida da Parceria (em 1991), pela
equipa de pesquisas, preparatórias da montagem da exposição “Faina Maior”.
Giraram os discos e rodou
a vida. Tem sido um tal voltear!
Ílhavo, 10 de Março 2016/2025
Ana
Maria Lopes
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