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Já finda o Maio e não ouvi nenhum pregão de galeota! Este ano não deve ter havido…
Nem vi, nem ouvi, nem comi, nem cheirei.
Ou está proibida a apanha…
Galeooooota!
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Pregão único, mas bem timbrado, repetido e prolongado!
Fez-me falta, sobretudo, o pregão. Faz-me bem à alma e
ao paladar – dizia um apreciador.
Marcava uma época – a época da galeota.
Costumava durar, cerca de um mês a mês e meio (de
Março a Abril), a venda da galeota, pelas
ruas de Ílhavo e zona das Gafanhas, porta a porta. No início da safra, era sempre cara como fogo; pudera! –
há um ano que não se lhe chincvaa!!!!
Mas à medida que se banalizava (por se ir
transformando no lingueirão), o preço descia, permitindo que bolsas menos
folgadas já lhe acedessem.
Sempre mais apoquentada
com as embarcações e processos de pesca usados do que com os prazeres
gastronómicos, ia frequentemente até à Costa Nova (junto à Biarritz e San Sebastian),
observar a sua apanha e ver as redes, bastante sui generis, nos trapiches,
a secar.
Hoje, já não tinha forças nem pachorra para andar de
botas de água, pela borda da ria ou junto às coroas, para gravar conversas e bater
chapas.
Já abordei esta apanha da galeota no Marintimidades, por algumas vezes,
mas não é que, ontem, numas arrumações do “baú de memórias”, encontrei mais
umas tantas imagens que cliquei em 11 de Março de 1986 de um lanço de galeota? Que maravilha! Já com trinta e sete aninhos…registadas
por mim, “à coca” de todos os pormenores. Conheço a “arte” de cor e salteado.
Toca de ordenar as imagens e de preparar a conversa para captar os
leitores/amantes do peixinho milagroso.
Trata-se um aparelho envolvente, tipo chincha, especialmente adaptado para a
apanha da galeota, uma espécie de
recém-nascido lingueirão.
Consta, essencialmente, de uma tira de rede, que
adelgaça para os calões, tendo, no
centro, um rectângulo de pano branco, um pano tipo mosquiteiro, muito franzido e folgado, que substitui o saco da chincha. O comprimento da rede é de
cerca de 40 metros, tendo o pano mosquiteiro
cerca de 2. A arte é feita com rede de traineira, usada.
Uma bateira vulgar (ou qualquer outro género de embarcação de fundo chato), era o tipo de embarcação utilizada neste processo de pesca.
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Fica um pescador em terra aguentando o cabo do reçoeiro, enquanto a bateira se afasta da margem, largando a
rede, a favor da corrente.
A partir do meio da rede, a embarcação dirige-se para a margem, completando o cerco, para o que fez um percurso, sensivelmente, em semicírculo.
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Aproada a bateira, os pescadores saltam para a
água e, em conjunto com o que havia ficado na margem, alam a rede. Vão-lhe dando sacudidelas rítmicas, para espantar e
conduzir o peixe para o pano.
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Camaradas alam a rede
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Percorrem a tralha da cortiça, até que ao chegar ao centro, com a galeota agrupada junto ao pano, levantam a rede fora de água, fechando a boca do saco.
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A galeota,
quando perseguida, esconde-se na areia branca, enterrando-se rapidamente. A
arte aproveitou engenhosamente esta particularidade, pois o pano branco consegue enganar a galeota, dando-lhe a ilusão de areia.
Por vezes, apenas dois pescadores lançam a rede.
Finalmente escolhem-na dos moliços e de outas mínimas ervagens, para a passarem para um balde ou para o quete da bateira.
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A galeota
mais apreciada pelos entendidos é a primeira, por ser mais pequena (a larva do lingueirão). Depois de
crescida, já não é tão saborosa (dizem os degustantes).
Apanhado o petisco sazonal, era preciso fazer o seu
escoamento imediato no mercado da Costa Nova, nos restaurantes da zona, porta a
porta, em grito estrídulo:
Galeooooota! É tempo dela!... – cantava o pregão.
E compradoras assomavam às portas!
Mas pareceu-me que o pregão estridente e bem-sonante
foi interrompido por exigências marítimas que transtornaram os pescadores.
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Fotografias – clichés
da autora do blogue, nos anos 80
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Ílhavo, 30 de Maio de 2023
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Ana Maria
Lopes
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