domingo, 27 de março de 2022

Bota abaixo do n/m "Novos Mares"

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Ontem, a propósito de uma exposição no MMI, “Bota-abaixo”, que muito apreciei, passou-me pela cabeça, todo o filme do bota-abaixo do navio-motor Novos Mares, há 64 anos.

A 19 de Março de 1958, tive, pois, oportunidade de reviver toda a minha emoção de madrinha do n/m S. Jorge, com o bota-abaixo do n/m Novos Mares, agora já uma “senhorinha”. Com os meus catorze anos, calçara, pela primeira vez, uns sapatos de salto alto. Lembro-me tão bem! Eram brancos!

Com a mudança de alguns actores, todo o cerimonial se repetiu, relativamente ao do lançamento à água do São Jorge: a chegada de autoridades em comboio especial, o almoço no Cine Teatro Avenida, em Aveiro.

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 Pormenor de alguns convidados

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A ementa era personalizada por uma bonita fotografia de Testa & Cunhas e seus navios: “Cruz de Malta”, “Inácio Cunha” e “São Jorge”.

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Pormenor da ementa

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Terminado o almoço, formou-se um extenso cortejo de automóveis, que se dirigiu aos Estaleiros. Não havia dúvida que era dia de grande festa.

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A população ribeirinha de Aveiro e Ílhavo sempre demonstrou especial predilecção pelas cerimónias de bota-abaixo, sentindo-as e compreendendo-as como poucas, não admirando, portanto, que a Gafanha da Nazaré registasse um movimento extraordinário.

A nova embarcação era produto do labor esforçado de cerca de 120 operários, durante catorze a quinze meses. Daria trabalho a uma tripulação de oitenta e três homens, que se viam privados do convívio das mulheres e dos filhos, durante seis longos e árduos meses. Foi seu primeiro capitão o Sr. Weber Pereira da Bela, de Ílhavo. A partir de 1961 e até 1974, última viagem de pesca à linha com dóris, seguiu-se o Capitão António Morais Pascoal, também nosso conterrâneo.

Junto à proa do Novos Mares, na tribuna habitual para convidados, sucederam-se os acontecimentos usuais: bênção da nova unidade pelo Sr. Bispo auxiliar de Aveiro, D. Domingos da Apresentação Fernandes, discursos, baptismo pela Senhora D. Maria Flor Ferreira Queirós, que já havia sido madrinha do primeiro Novos Mares (1938), a quem ofereci um bonito ramo de flores.

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A madrinha do navio (à direita)
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Continuava a ser uma honraria para a tal “senhorinha”, a querer espigar, participar em actos tão solenes, assistindo, perplexa e deslumbrada.

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Bênção da nova unidade
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Entre os discursos, com o seu feitio acalorado, o do Mestre Manuel Maria Mónica, era sempre emotivo. Ao falar aos colaboradores, armadores e governantes, o seu facies transformava-se de perturbação e envolvimento.

A um sinal de Mestre Mónica, o Sr. Eng. Higino de Queirós cortou o cabo da bimbarra, começando o navio a deslizar suavemente. Depois mais rapidamente, as obras vivas, como que num choque, mergulham nas águas da ria pela primeira vez.

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Pormenor, à esquerda, do cabo da bimbarra
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O Novos Mares penetrou nas águas da ria
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Com os navios embandeirados em arco, como sempre, nas cerimónias festivas, entre o estalejar de foguetes e os silvos das sirenes dos barcos, o novo navio procura posição, enquanto ocupantes de pequenas embarcações, como habitualmente, recolhem das águas alguns restos de madeira, com que vão atear a fogueira de Inverno, que os aquecerá.

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Cerimónia sempre impressionante e comovente!
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Aproveitem, até, e dêem um saltinho a esta exposição patente no MMI., até 8 de Maio. Não será tão emocionante como para mim, mas, certamente, gostarão e não darão o vosso tempo como perdido.

A exposição BOTA-ABAIXO espelha a memória e a tradição da construção naval em madeira, nos municípios de Ílhavo, Peniche e Murtosa e está inserida no projecto “Territórios com história”.

Fotografias – Arquivo pessoal da autora

Ílhavo, 26 de Março de 2022

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Ana Maria Lopes

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