A tirar o sal…
Marinha botada é marinha viva! É marinha fértil, a
produzir intensamente sob forte canícula...
Entre o bulir, o quebrar e o rer, é preciso acarretar o sal escorrido
de moiras, que repousa ao longo de grandes tabuleiros de lama
dura – enche-se a canastra e lança-se sobre a cabeça já conformada ao
peso do carreto.
Nesta dura labuta da extracção, só o sol, o vento e
a canseira acompanham esta gente.
Vão tirar o sal... é tarefa pesada e rotineira!
Ali, só uma forte alma consegue aconchegar um corpo sofrido
do sal.
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Nesta penosa mas recompensadora
tarefa, já o horizonte se encontra salpicado de incontáveis pontos brancos.
Os homens percorrem o reticulado labiríntico, de canastra à cabeça em perfeito equilíbrio, de liame em liame…
Acarretam energicamente o sal rido,
do tabuleiro para o malhadal, num sem fim de viagens, em passo
acelerado e cadenciado – num ritual que se entranha no corpo!
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De pés descalços, usando a sola natural, calejada e
corroída pelo sal, os moços atravessam sofredores, mas ligeiros, o entraval que
separa o tabuleiro do malhadal.
É a fronteira entre a feitura e a conservação.
Com o corpo escorrendo o suor do sal, suportam o peso da canastra,
que redobra a cada viagem e vergam-se à dor e ao contrato de uma safra que demora...
São jovens ainda, utilizam a força e a tenacidade como seus
aliados, mas são longos e sofredores os seus Verões.
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Com gestos precisos, esses homens
habituados à rudeza do trabalho tiram e atiram o sal da água para o coruto
do monte, que vai crescendo em direcção ao céu.
Sobem e descem habilmente, como
equilibristas habituados a malabarismos ousados, por longas pranchas
inclinadas, sobre tapete de pedras cortantes.
Agrestes percursos, esses!
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Só as águas adormecidas ao sol espelham e retratam tão ritmado movimento dos carregadores. Eles caminham em
passo acelerado, pois o frete é pesado!
Entre gestos de destreza e força,
é com suor e dor que sobem e descem muros, que transpõem valas e
escalam montes, carregando, transportando e despejando o proveito do dia
sobre a eira.
É esta gente do salgado
que diariamente se submete, numa entrega cega, à faina da marinha –
repara, conserva e explora, palmilhando, a pés nus, as rudes vidraças de água
espelhada.
É nessa paisagem, onde se
recortam cordilheiras de cones brancos abicados para o céu, reflectidos num
maravilhoso reino aquoso, que o real se confunde com o ilusório…
Enquanto o sol aquecer e o vento
se fizer sentir sobre as águas, o homem do sal não descansa – ali mora o
seu sofrimento, ele é rei e escravo – é a sua sina!
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Nota – Para esclarecimento de
linguagem técnica, consultar GLOSSÁRIO de Diamantino Dias.
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Imagens | Paulo Godinho | Anos 80
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19| 11 | 2013
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Texto | Etelvina Almeida |Ana Maria Lopes
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