terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O palhabote Orion

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Sempre me despertou a atenção o nome do lugre Orion, pela beleza da denominação (na mitologia grega, foi um gigante caçador colocado por Zeus entre as estrelas na forma da constelação, Orion), pela elegância das imagens conhecidas do navio e pela curiosidade do lugar em que foi construído, um estaleiro em Aveiro, exactamente junto à ponte da Dobadoura, no lado oposto ao Rossio, em pleno coração da cidade, onde hoje se encontra o monumento à Aviação Naval. É agradável por lá passar, reconhecer as casas, ainda pertencentes à época e imaginar a azáfama que teria caracterizado o local, enquanto estaleiro.
Excerto curioso da notícia dada pelo jornal «O Democrata» de 31.7.1920, com respeito pela ortografia da época:

«(…)A operação, que foi observada por milhares de pessoas estendidas pelas duas margens da ria, que ofereciam espectáculo na verdade admirável, correu perfeitamente, entrando o barco na agua entre estrepitosas palmas, vivas, entusiasmo que avassalou toda a gente a maior parte da qual se descobriu acenando com chapeos e lenços para bordo do barco onde eram queimados inúmeros foguetes.
Pouco depois a empreza recebia os seus convidados a quem ofereceu um abundante copo dagua, levantando-se por essa ocasião vários brindes, calorosamente correspondidos (…)».


O palhabote Orion, em dia de bota-abaixo


O palhabote Orion, construído por José Maria de Lemos, de Aveiro, para o armador Lemos, Sobreiro & Cª, Ldª, também de Aveiro, teve o seu bota-abaixo no dia 25 de Julho de 1920.
Com um comprimento entre perpendiculares de 30, 80 metros, boca de 8, 34 m. e pontal de 3, 40 m., tinha uma tonelagem bruta de 183,32 e líquida de 130,83 toneladas.
Não possuía motor auxiliar.

Durante os anos de 1921 e 22, foi governado pelo capitão ilhavense Aquiles Gonçalves Bilelo (1887 – 1962).


O Orion atracado no Cais das Pirâmides

O elegante navio, de dois mastros, nos anos 1923 e 1924, passou a pertencer ao armador Bagão, Nunes & Machado, Lda., de Lisboa, continuando a ser comandado pelo saudoso Capitão Aquiles Bilelo.
Entre os anos 1925 e 1934, pertença ainda do mesmo armador de Lisboa, a estrutura do Orion alterou-se, tendo-lhe sido aplicado um terceiro mastro, com o objectivo de lhe melhorar a velocidade, pois continuava sem motor auxiliar.
Surgiu, então, o lugre Orion, também com modificação de dimensões: comprimento entre perpendiculares de 34, 20 metros, boca de 8,40 m. e pontal de 3,40 m.

O capitão Aquiles continuou a capitaneá-lo até 1929. Em 1928, foi piloto o oficial José Vaz.

Lugre Orion


Em 1934, passou a pertencer ao armador Amândio F. Matias Lau, de Aveiro, tendo sido empregue na pesca costeira.
Entre 1935 e 45, esteve na posse da Sociedade de Navegação Costeira Nossa Senhora da Agonia, Lda., de Viana do Castelo. Sempre sem motor auxiliar e com uma tripulação de 9 tripulantes, foi utilizado no tráfego costeiro internacional.
Manteve-se em serviço activo e regular até naufragar em condições de grande temporal, a cerca de 10 milhas de Alger, em 19. 12. 1945.

A tripulação conseguiu salvar-se nas baleeiras do navio.
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Fotografias – Arquivo H. Ramos, Arquivo Digital de Aveiro, espólio de Morais Sarmento, e a do lugre, amavelmente cedida pelo MMI.

Ílhavo, 28 de Dezembro de 2010
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Ana Maria Lopes
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7 comentários:

  1. Olá, Ana Maria!
    Ando a fazer uma pesquisa sobre o meu bisavô e um objecto que ele deixou ao meu pai: uma bússola. Acontece que não consigo saber grande coisa dele: apenas que trabalhou num navio Bacalhoeiro - "Inácio Cunha"- e num outro - "Avé Maria"- ambos de Aveiro. Andava eu nas minhas pesquisas quando encontrei o seu Blog e o Artigo de Abril de 2009 que fala do Navio "Inácio Cunha"...O que eu lhe queria perguntar era se tem acesso ao nome dos tripulantes deste navio (ou até mesmo do Avé Maria) e se me poderia dizer se, de facto, o meu bisavô trabalhou lá...Eu sou da Figueira da Foz, poderia mesmo ir a Aveiro, mas estou na universidade e não me consigo lá deslocar...Seria óptimo se soubesse alguma coisa: precisava muito de saber essa informação, se é verdade que o meu bisavô trabalhou mesmo nestes dois navios...Se souber de alguma coisa, por favor, diga qualquer coisa aqui no seu Blog para depois eu a puder contactar com mais calma...
    Fico à espera de resposta e muito obrigada pela anteção dispensada.
    Erica

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  2. Boa noite:

    Sabe dizer-me o nome completo do seu bisavô? Seria indispensável o nome certo e completo, para poder consultar as fichas de inscrição no Grémio.
    Já agora, tem uma ideia da data em que ele tenha nascido?
    De facto, o Inácio Cunha e o Avé Maria são dois navios bacalhoeiros da praça da Aveiro, mas ter possibilidade de consulta das suas tripulações, durante todos os anos em que pescaram, não é muito viável.

    Cumprimentos

    AML

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  3. Olá Ana Maria,
    Desde já agradeço-lhe do fundo do coração a disponibilidade que mostrou em ajudar-me!
    Do meu bisavô, por mais que procure, a única coisa que sei é que se chamava António Pereira e que era natural de Buarcos - Figueira da Foz. Sendo que depois veio viver para S.Pedro, que na altura ainda pertencia a Lavos. Não consigo saber mais nada dele: nem a data de nascimento...
    Podia então averiguar-me se realmente é verdade que o meu avô trabalhou nesses dois navios e as datas em que tal aconteceu?
    Agradeço muito mesmo, e peço desde já desculpa por algum incomodo que lhe possa causar...

    Os meus maiores cumprimentos e votos de um feliz Ano Novo.

    Erica

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  4. Olá:

    Hoje estive no Museu e fui, embora com alguma dificuldade, por falta de dados seguros, procurar elementos. Creio que encontrei a Ficha de Inscrição dele, no Grémio.
    Chama-se, como diz, só, António Pereira e nasceu em 20 de Abril de 1910, em S. Julião, freguesia da Figueira da Foz.

    Começou a sua vida de pescador do bacalhau em 1933, tendo feito a viagem de 1939 no lugre GAMO.
    Andou em bastantes mais navios, mas os últimos foram, de facto,o Inácio Cunha(de 1953 a 1956) e o Avé Maria (de 1957 a 59).

    A partir daqui, não saberei dizer-lhe mais. Se estiver interessada, poderei enviar-lhe via mail, a respectiva ficha do Grémio.
    Cumprimentos

    AML

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  5. Olá Ana Maria,
    É com muita alegria que, depois de uma semana intensa e cheia de exames, na universidade recebo a sua noticia!
    Nem sei como lhe agrader!
    Se me pudesse mandar a ficha eu agradecia...
    Estou-lhe muito muito grata mesmo, era de extrema importância para mim saber o quem foi o meu bisavô e o que fez da vida.
    Espero que este ano lhe traga tudo de bom mesmo, porque a Senhora merece! Foi muito generosa em ter-me ajudado sem me conhecer: nem todas as pessoas fazem isso!
    Mais uma vez mil obrigados.
    Cumprimentos

    Erica Eires

    P.S.: O meu e-mail é: erica_eires@hotmail.com .

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  6. É interessante a necessidade de se aumentar o velame e o tamanho dos navios do bacalhau. Essa necessidade foi resultado dos poucos ou nenhuns lucros que deram os primeiros palhabotes construidos em Lisboa... Felizmente, com a diminuição drastica da caça à baleia, devido ao aparecimento dos combustiveis fosseis e da luz eletrica, passou a haver disponiveis navios de três mastros de maiores dimensões para a pesca do fiel amigo. Lembro-me particularmente de uma barca «EMPRESA» e julgo que o Gazela I também passou um periodo nessa actividade...
    Quanto ao aumento do tamanho dos navios li tambem que um dos Julias, da praça da Figueira da Foz, foi aumentado e recebeu mais um mastro...

    Antonio Angeja

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  7. Li por ali o nome de um lugre chamado GAMO em 1939... Estranhei a data porque existiu um Lugre GAMO, durante a 1ªGG, que foi afundado a tiro por um submarino alemão em Agosto de 1918... O seu capitão João Mano trouxe grande parte da tripulação em 13 doris até aos Açores, tendo percorrido cerca de 400 milhas nas frageis embarcações... Aquele GAMO de 39 deve ser o construido em 1921.... É interessante como num tão curto espaço de tempo aparecem dois GAMOS na Frota Bacalhoeira...
    Também é interessante que nesta nossa cidade quase não se lembre o suficiente essa epopeia de SOBREVIVENCIA da tripulação do GAMA... muito semelhante áquelas que aparecem na bibliografia estrangeira...

    Antonio Angeja

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