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Em época de exames, – veio-me à
cabeça um capítulo da minha vida escolar em que também teve lugar a escola
Primária da Gafanha da Encarnação.
Vou para a Costa Nova, no Verão, desde que nasci, sempre para a mesma casa, apesar de algumas transformações.
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Antes de ter a arquitectura actual, era um bonito palheiro de rés-do-chão em adobe, com varanda, o terceiro da Calçada Arrais Ançã (lado sul), a partir do actual Largo da Marisqueira, de onde se usufrui uma paisagem inebriante e mutante, de dia e de noite, ao amanhecer e ao entardecer. Era esta a vista da minha casa, até 1973, inserida num horizonte sem fim.
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Com o aterro parcial da laguna (seria
necessário?), foi-me roubada.
Costa Nova dos meus encantos!!!!! Adeus, bateira “Namy”, atracada ao moirão multicolor, em frente a casa! Adeus, serventia do embarcadouro da barca! Adeus, travessia, para a “Bruxa”. Adeus, pesca, ao caranguejo da muralha com fio, pedra ou concha e uma lasquita de bacalhau! Também passaram à história as belíssimas atracações da barca, ao perto, em dias de nortada ou de inverno, com marola forte e vento rijo, não sei se à Labareda nem se não. Mas lá que eram bonitas, certeiras e arrojadas, eram.
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Mas, voltando à história, frequentei
a 1ª e 3ª classes da Escola Primária, nesta linda praia, entre ria e mar
situada.
Foi minha professora, a Senhora D.
Palmira/Palmirinha, de quem guardo gratas recordações, bem como de uma ou outra
colega que ainda hoje reconheço.
O local para a Escola Primária que frequentei foi criado em 1930, na então Avenida Boa-Vista, a norte.
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Chegado o final do ano lectivo de
1950-51, o exame da 3ª classe estava à porta. O meu primeiro exame. E onde
fazê-lo? Tinha de ser na Escola da Gafanha da Encarnação.
Sempre que lá passo, me lembro.
Claro, tínhamos que ir de barca, à vara, tão calmo estava o dia de
Junho, e, a pé, até à escola. Vestido novo… toda enfeitada.
Uma nova escola, novos professores,
novo ambiente…algum nervosismo.
O texto que me saiu em sorte foi “A libelinha e as folhas de nenúfar”. Correu bem e, no final, bom resultado.
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Voltámos. A minha Mãe e Avó
esperavam-me…com ansiedade. A sua menina a chegar do primeiro exame… e de barca!!! Quem se gaba do mesmo?
Um pequeno percalço, no regresso:
escorregou-me um lápis novinho em folha, costado abaixo e enfiou-se debaixo dos
pesadões paneiros da embarcação.
Por mais que pedisse, lamuriosa, ao
barqueiro, ele não se compadeceu da minha mágoa. Será que um insignificante
lápis merecia o trabalhão de levantar um ou dois paneiros da grande barca?...
Lá ficou para sempre, mas não me esqueci…
O que interessava é que estava na 4ª
classe, com as férias à porta…
Hoje, para mim, a Costa Nova não tem os mesmos encantos. A idade não perdoa e já não vou ao mar, nem lá tomo banho, não ando na ria, porque não tenho nenhuma embarcação, nem a barca para me atravessar para a “Bruxa”. Como já não ando de bicicleta por causa de algum desequilíbrio, não posso aproveitar as ciclovias. E sinto falta de um espaço em que haja um contacto directo com a ria/água, onde ao menos se possam molhar os pés. Usufruo da minha varanda, uma paisagem idêntica e sempre nostálgica, com várias mutações, consoante o tempo e a hora do dia, com a ria mais ao fundo, trocada por relvado amarelecido. Além do mais, às vezes, estou à varanda, uma tarde, em que não vejo meia dúzia de pessoas conhecidas e, essa constatação, é a lei da vida, tem tendência a aumentar…
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Ílhavo, 20 de Junho de 2023
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Ana Maria Lopes
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