sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A bateira erveira de Canelas - II

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Servia para mudar gado ou carrear estrume, transportava pessoal, ervas e apanhava moliço.
Embarcação de trabalho, chegou a deslocar-se até à feira dos treze, na Vista Alegre, ao canal de S. Roque para compra de sal e não faltava aos arraiais das festas setembrinas. Podia ter ou não leme, embora para ele estivesse preparada, falcas e vela. Com estes apetrechos se deslocava anualmente à romaria do S. Paio, servindo de abrigo aos seus donos, e proporcionando-lhes uns dias de reinação e de folguedo.

Bateira erveira no S. Paio de 1993


O que sempre tinha e que a distinguia das demais bateiras, eram quatro golfiões, bem salientes, dois à proa e dois à ré. Nos esteiros acanhados da região e, sobretudo, quando transportava gado, era deslocada, por terra, da margem, por duas pessoas, com o auxílio de duas varas, que “beiçavam” firmemente nos golfiões.

Em pesquisas, nos anos 80, pela ria, e sempre sequiosa de informações, soube que ainda poderia conhecer o mestre-construtor destas embarcações. Lá fui até casa dele em Canelas, o ti Arnaldo Domingues Rodrigues Pires (1921 – 1997), que, amavelmente, me mostrou o local, onde construía, à época, pequenas caçadeiras e os antigos moldes da última bateira erveira de Salreu, por ele construída em 1964. Orgulhava-se da obra.

Também tinha trabalhado com os Mestres Luciano e Manuel Maria Garrido, durante 31 anos, sobre os quais me confessou não serem dos mais hábeis na construção de barcos moliceiros.

Em Outubro de 1994, a referida embarcação foi adquirida pela Associação dos Amigos do Museu ao próprio dono, Sr. José Luciano de Andrade, conhecido pelo Ti Zé da Fonte.

Foi o próprio Ti Arnaldo quem ofereceu ao Museu os seus moldes, que lhe serviam de suporte à construção e que podem aí ser identificados com as respectivas partes da embarcação.

Antiga Sala da Ria – 1995

(Cont.)

Ílhavo, 14 de Janeiro de 2011

Ana Maria Lopes
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3 comentários:

  1. Boa tarde.

    E a continuação deste seu artigo volta a transmitir esse tempo em que barcos e pessoas se uniam em vidas mais ou menos difíceis mas verdadeiras e sem as muitas "loucuras" de hoje. Hoje temos as loucuras e constante correria, mas os barcos, seus "fazedores" e utilizadores... foram-se. Com eles foi-se um grande pedaço de muitos de nós. Terras da costa ou terras do interior, não há diferença. Foi-se quase tudo.

    Atentamente,
    www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt

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  2. No início da década de sessenta do séc.XX ainda existia em Canelas um outro construtor de bateiras e de caçadeiras de nome Beirão e que morava na Rua da Estação, nas proximidades da EN 109. Terá falecido em meados ou finais dessa década.

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  3. Neta do Manuel da Fontesegunda-feira, janeiro 17, 2011

    Foi com imenso agrado que cheguei ao seu blog, através do Sem Rumo, e li esta preciosidade sobre a Bateira Erveira de Canelas, tema que me é muito familiar. Esta bateira pertencia à minha família, era propriedade do Ti Manel da Fonte meu avô, sendo o Zé da Fonte um dos filhos, e meu tio. É evidente que sempre que se fala da Bateira a emoção vem à flor da pele, e este apontamento por si feito é exemplar, por curiosidade os meninos que se encontarm na ria a tomar banho são bisnetos do Ti Manel da Fonte, o Tiago e a Joana, foi surpreemdente pois não temos esta fotografia.
    Foi muito bom voltar a recordar tudo isto.
    CPTS

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