Capitão Francisco Correia Marques
Francisco Correia
Marques nasceu em Ílhavo a 14 de Dezembro de 1930, sendo um dos filhos de uma prole de oito irmãos, dos quais
três rapazes, todos oficiais da Marinha Mercante, embora, um deles, por doença,
nunca tivesse chegado a experimentar o mar. Quer do lado de sua Mãe, Nazaré
Correia, como do lado de seu Pai, António Marques, existia uma vasta tradição
familiar de actividades ligadas ao mar.
Depois de completar o curso
complementar dos liceus, em Aveiro, foi para Lisboa para frequentar o curso de
pilotagem na Escola Náutica, que terminou em 1949. Era portador da cédula marítima nº 115236, passada na
Capitania do Porto de Lisboa em 8 de Agosto de 1949.
Com estes antecedentes familiares,
só o mar o podia esperar……….
Do casamento com Maria
dos Prazeres Valente Labrincha (a Zerinhas), nasceram dois rapazes, o António
Augusto e o Francisco e a Maria do Rosário. O Francisco tirou o
curso de oficial da Marinha Mercante, chegando a andar embarcado com o Pai.
Francisco Marques iniciou a pesca ao bacalhau, nas
campanhas de 1949 (uma viagem) e de 1950 (duas viagens), como piloto do arrastão São Gonçalinho, sob o comando de seu tio, Francisco dos Santos Calão (1949 e 50) e de José de Oliveira Rocha (2ª viagem de 1950). Este, imediato nas duas primeiras viagens, na terceira, passou a capitão, tendo sido substituído por Eduardo Pereira Afonso, de Lisboa. O São Gonçalinho, mandado construir
igualmente pela EPA, nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, fez a sua
primeira viagem em 1948.
Nas
safras de 1951, 52 e 53, passou para a pesca à linha, a sua
grande paixão, como imediato do lugre-motor, de madeira, Adélia Maria, sob o comando de seu sogro, Augusto dos Santos
Labrincha Laruncho. O lugre, da praça de Aveiro, foi mandado
construir para o armador José Maria Vilarinho, em 1948.
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O lugre Adélia Maria, entre botes, em mar chão…
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Na campanha de 1954 assumiu o comando desse lugre, onde se manteve sete anos, até 1960. Entre os diversos imediatos que
levou, durante as safras de 1956, 57e 58, conta-se o ílhavo António José Pereira Teles.
A bordo do lugre
Adélia Maria, anos 50…
Francisco Marques, nas
safras de 1961 e 62, transferiu-se para capitão do navio-motor, em aço, Capitão
José Vilarinho, construído para José Maria Vilarinho, nos Estaleiros Navais do Mondego, Figueira da
Foz, em 1954.
Interrompeu a sua actividade, para voltar, de Novembro de 1962 a Fevereiro de 1963, à Escola Náutica, para fazer o curso complementar de pilotagem.
Interrompeu a sua actividade, para voltar, de Novembro de 1962 a Fevereiro de 1963, à Escola Náutica, para fazer o curso complementar de pilotagem.
O navio-motor
Capitão José Vilarinho
Na campanha de 1963, embarcou de imediato no São Ruy, navio-motor em aço, da Empresa de Pesca de Viana, sob o comando do conterrâneo Joaquim Fernandes Agualuza. No ano seguinte, 1964, assumiu o cargo de capitão.
Chegou a hora de mudar
de vida e de terra e, de casa às costas, o Cap. Chico, de 1964 a 1972 e de 1974 a 1975, suspendeu a sua vida no mar e
trabalhou na Parceria Geral de Pescarias, na Azinheira (Barreiro), como
«capitão de terra».
Em
1973, voltou aos mares da Terra Nova e Groenlândia. Foi
desafiado a exercer o cargo de capitão no Creoula,
a última viagem do velho lugre-motor. O
Francisco tinha saudades do mar, em
todas as suas vivências, desde o mar de senhoras ao de vagas alterosas,
desde os gelos perigosos e brumas imprevistas e cerradas às calmarias azulinas, reflexo de céus esplendorosos..… O «nosso capitão» era
daqueles a quem o mar fazia falta, como suporte vital, além da família, que
sempre levava bem juntinho ao coração.
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Pescador entre pilhas
de botes, no Creoula, em 1973
Com as mudanças inevitáveis
dos processos de pesca, em 1976, depositou o saco no convés do navio, para, desta vez, comandar o Neptuno, navio-motor, em aço, no qual faria a sua última viagem, em 1986. O Neptuno, tendo sido construído
para a Parceria Geral de Pescarias, nos Estaleiros de São Jacinto, em 1958,
foi transformado em navio de redes de emalhar com lanchas, em 1971.
Ao leme, no navio-motor
Neptuno. 1978
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Em final de rota, nos anos 80 e no começo da década de 90 orientou cursos de formação em
empresas de pesca e no Sindicato dos Pescadores de Aveiro.
Tendo acabado a sua carreira profissional, voltou à terra natal. Conhecedora do seu saber, disponibilidade, parentesco e vizinhança,
propus-lhe ser o supervisor técnico de um documentário À Glória desta Faina, a apresentar no auditório do Museu, em
Novembro de 1989. Casas cheias…Daí a
uma colaboração importante, sistemática e valiosa com o Museu Marítimo e
Regional de Ílhavo, iniciada em 1992,
foi um passo. Vivemos um tempo de satisfação, de paixão, cumplicidade e entusiasmo.
De 1994 a 1999, na
Associação dos Amigos do Museu, foi seu vice-presidente.
Desafiados pela editora
Quetzal, assumimos a co-autoria, do livro Faina
Maior – A Pesca do Bacalhau nos Mares da Terra Nova, publicado em 1996. E com que entusiasmo e enlevo!...
Premiado com o «Leme do Ano», A Faina
Maior, com o apoio da Associação dos Amigos do Museu, já teve mais duas edições (2011
e 2015).
Entre Agosto e Setembro
de 1998, voluntariamente, foi Director
de Treino de Mar na viagem do Creoula ao
Canadá, integrada no projecto De Novo na
Terra Nova. Era carinhosamente tratado pelo Avô-barbas.
Perante uma reviravolta
inesperada, nos órgãos directivos do Museu, o Cap. Chico Marques, entre finais
de 1999 e 2002 assumiu a direcção executiva
do Museu Marítimo de Ílhavo.
Escreveu vários artigos
sobre memórias da pesca do bacalhau e temas de navegação, tendo participado em
diversas conferências e programas de televisão.
Nesta última fase,
vivia intensamente o mar, em terra...
Por tudo quanto foi
recordado, foi-lhe atribuída, e bem, a medalha do Concelho, em ouro, em 16 de Abril de 2001.
Já bastante debilitado,
proferiu a sua última palestra, em 18 de Março de 2006, da qual o Museu Marítimo de Ílhavo publicou a brochura Navegação dos Bacalhoeiros nos Mares da
Terra Nova.
Tendo lutado contra uma
doença, qual Poseidon contra mar encrespado, sairia, para nosso lamento,
vencido. E assim nos deixou a 2 de Novembro de 2006, há cerca de dez anos, perante a dor e a saudade de todos os
familiares, amigos e dos que, de perto, conviveram com ele. Prolongou a sua
vida de mar em terra, nesta terra que foi, sobretudo, de gente do Mar
Imagens
– Arquivo
pessoal e gentil cedência da Família
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Ílhavo,
6 de Dezembro de 2016
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Ana Maria Lopes
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