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Enquanto
ia pesquisando e escrevendo sobre o currículo marítimo do Capitão João Ventura
da Cruz, iam-se-me cruzando dados, e não por acaso, com o Capitão Francisco
Calão (n. 1897). Não queria deixar de o referenciar, até porque me lembro
nitidamente dele, na sua casa encostada à minha, na Costa Nova e, porque, como
capitão da Empresa de Pesca de Aveiro, teve um papel fulcral na mudança da
pesca do bacalhau à linha para o arrasto lateral. Filho de João Nunes da
Barbeira e de Joana Correia, casou com a Senhora D. Maria de Oliveira Mendes,
de quem teve três filhos – Maria, David Manuel e Francisco Manuel Mendes Calão,
de quem bem me recordo.
Era
possuidor da cédula marítima 9511 passada pela capitania do porto de Aveiro, em
22 de Fevereiro de 1911.
Há
dias, na Costa Nova, em conversa com o Sr. Cap. Manuel Machado, nos seus
vetustos, mas muito lúcidos 90 anos, que havia sido seu piloto, na viagem de 1951, no arrastão São Gonçalinho,
veio à baila a sua recordação, bem
como a de meu avô, que era seu irmão, de quem se lembrava bem.
Continuando…
Ao Jornal do Pescador de Fevereiro de
1952, o capitão Chico testemunhou, à
época, que comandava navios bacalhoeiros há 31 anos, tendo sido o lugre de pesca à linha, Águia, pertencente à Companhia
Aveirense, o primeiro em que se iniciara, em 1921.
Águia?
O nome já me passou pelas mãos… ou pelos olhos… pensara.
O
lugre Águia, registado em Aveiro, foi construído na Gafanha da Nazaré, em
1919, por Manuel Maria Bolais Mónica, para a Companhia Aveirense de Navegação e
Pesca. Era um lugre com três mastros,
de madeira, proa de beque, popa de painel
e um pavimento. Mais tarde, pelos anos 20, tendo mudado de dono, passou a ser o
Silvina, que já não cheguei a
conhecer, pois ardeu na viagem de 1941. A propósito, ver o capítulo O Silvina
em Chamas, em Os Grandes
Trabalhadores do Mar de Jorge Simões, última edição, p. 103 a 113.
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O lugre Águia. 1919
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Quem
procura sempre alcança e nas buscas habituais, mas intensas, lá descobri que
comandara, na safra de 1934, o Rosita, da praça do Porto. Era o ex-lugre, de madeira, Edith M. Cavell, construído em Melburne, propriedade de Copérnico da
Conceição da Rocha, de Ílhavo. Participou nas campanhas de 1930 a 1934. Será
que o Sr. Capitão Chico o comandara nestes quatro anos (1930, 31, 32 e 33)? Falta
de dados seguros não nos permite concluir isso. Como ainda me lembro do Sr. Copérnico
e sua Esposa em curtas estadias e visitas que faziam à família Rocha, no Alto
Bandeira - irmão de Conceição e Rosa Rocha, tio de Maria da Conceição Rocha Mano
e de José (Zeca) Mano.
Na
campanha de 1935, no dia 12 de
Julho, quando comandava o lugre Santa Joana (um dos quatro Santas
que tivera pescado pela primeira vez, na Groenlândia, em 1931), fora abalroado por um navio de pesca norueguês, na
Groenlândia, conforme protesto existente no Ciemar. Pilotava-o o Sr. Manuel
Gonçalves Viana.
O
Capitão Chico, como carinhosamente era tratado, fizera as safras de 1936 e de 37, no comando do lugre
com motor Santa Izabel, igualmente
pertencente à EPA. Voltou a ser seu piloto Manuel Gonçalves Viana.
O
capitão Francisco Calão, na sua possante estatura de 1, 80 de altura, corpulento,
foi um verdadeiro lobo-do-mar. À sua valentia e arrojo, aliava uma competência
reconhecida e comprovada por todos os seus colegas e por tantos actos
temerários durante a sua já longa vida de marinheiro. Era desejado por diversos
armadores, mas, como a sua biografia marítima o comprovou, não gostava de saltar e, por isso, se manteve a servir a mesma casa
– neste caso, a Empresa de Pesca de Aveiro, conhecida pela empresa do Sr. Egas
Salgueiro ou até do Egas.
No
ano de 1938, deu-se a grande viragem
na sua vida e deixou a pesca à linha do bacalhau para se entregar, de alma e
coração, ao comando do único, à data, arrastão
clássico, o então recente Santa
Joana, onde se conservou até 1946 (inclusive).
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Pesca de arrasto lateral
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Durante
estes anos, foram seus imediatos, os ilhavenses Manuel Pereira da Bela (1938), António Trindade da Silva Paião
(39), Manuel Gonçalves Viana (40), Jacob de Oliveira Mendes (1941 a 45) e João Laruncho de São Marcos (1946) e pilotos, José Nunes de Oliveira (38), Manuel Gonçalves Viana (1939),
João Simões Ré (40), Manuel de
Oliveira Júnior, de alcunha Bernardo (1942 e 43),
José Pelicas Gonçalves Bilelo (46) e
praticante de piloto, David Manuel Calão (46).
O arrastão Santa Joana fez duas viagens nos anos de 1938, 1939, 1944, 1945 e 1946
e uma, nos anos sobrantes (40, 41, 42 e 43).
Na
segunda viagem de 1946, o Capitão
Chico ficou em terra para prestar assistência à construção do São Gonçalinho, mandado construir
igualmente pela Empresa de Pesca de Aveiro, nos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo.
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A bordo, com a autoridade…
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Foi
também ele que, em 1947, foi buscar
a Inglaterra os caça-submarinos Killdary
e Killmalcom que, depois de
transformados em atuneiros com os nomes de Rio
Vouga e Rio Águeda, viriam a
aumentar e enriquecer a frota da referida empresa, com esta nova modalidade de
pesca.
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Em
1948, estreou como capitão o citado arrastão São Gonçalinho, que comandou até 1953, com algumas interrupções, devido à doença que o traiu e contra
a qual tanto lutou.
Foram
seus imediatos, no São Gonçalinho,
os ilhavenses José de Oliveira Rocha (48,
49, 50), José Simões Negócio (51),
Manuel Gonçalves da Silva, de alcunha Paroleiro,
(52, 53), e pilotos, Francisco
Correia Marques (49 e 50), Manuel Marques Machado (51),
e Juvenal Carlos Filipe Fernandes (52 e 53) da Gafanha da Nazaré.
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O
arrastão São
Gonçalinho
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O
arrastão São Gonçalinho fez duas viagens nos anos de 1949, 50, 52 e 53 e uma,
nos anos sobrantes (1948 e 51).
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À esquerda, José Rocha e Francisco Calão, a
meio
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À
saída do Tejo, a 27 de Fevereiro de 1952,
no São Gonçalinho, mal diria o «nosso
capitão» que a caminho dos bancos, por altura dos Açores, seria acometido por
doença grave que exigiria uma arribada ao porto de Ponta Delgada e o seu
regresso urgente, por avião, à Metrópole, para ser intervencionado. Terá sido o
começo do fim, que se arrastou ainda por uns péssimos anos. Informada a empresa armadora, o navio seguiu viagem,
logo que possível, sob o comando do Sr. António Augusto Marques, de alcunha, o Marcela.
A
vida não parou, nunca pára, mas afrouxou, de algum modo. O estado físico e
emocional deste grande lobo-do-mar fora abalado.
Mas,
com a sua coragem e luta contra a doença, retomou o comando na 1 ª viagem de 1953 do «seu» arrastão.
O
estado de saúde agravara-se e teve de ser internado num hospital, em St.
Jonh´s. Segundo o jornal local de 10 de Agosto de 1953, de regresso da Terra Nova, onde deu entrada
numa casa de saúde para lhe ser amputada uma perna, chegou a Ílhavo o nosso
amigo e conterrâneo Francisco dos Santos Calão que ali demorou até lhe poder
ser aplicado um aparelho ortopédico, que lhe permitisse andar regularmente.
Fora
o Capitão Manuel Gonçalves da Silva, Paroleiro,
que era o imediato, que lhe sucedera, na viagem.
Encerrara-se,
deste modo, a vida marítima deste arrojado homem do mar, minado pela diabetes, embora
só nos tivesse deixado, a 7 de Novembro de 1961, com 64 anos de idade e sobrecarregado
pelo peso do sofrimento e da amargura.
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Imagens
– Arquivo
pessoal e gentil cedência de familiar
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Ílhavo,
8 de Novembro de 2016
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Ana Maria Lopes
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